quarta-feira, 23 de março de 2011

As Batalhas do Castelo

Após a morte do rei, o bobo da corte herda o título de duque e um castelo. A partir daí, ele passa a se chamar Bobuque e vai conduzir, ao ducado, os súditos que os dois príncipes, filhos do rei, lhe designam por deboche: os velhos, doentes e aleijados do reino, além de algumas crianças miseráveis e famintas e de ex-prisioneiros sem esperanças. A estranha comitiva parte rumo ao Castelo do Canto, uma construção abandonada num penhasco semi-árido. Se tudo parece caminhar para o fracasso, é exatamente o contrário que ocorre: liderados pela sábia filosofia de vida de Bobuque, o grupo vai se conhecendo, exercendo suas capacidades e fazendo o melhor de si para formar um povo unido e vitorioso.

Moçada do 1A e 1B do CEMAP

Vamos compartilhar aqui as leituras e interpretações que fizemos da obra!

Roteiro de teatro - Aluno Vítor Maia - 1B - 2012


AS BATALHAS DO CASTELO

1º ATO - A HERANÇA REAL

A historia começa no castelo Real, dentro do dormitório Real onde morria o então atual Rei. De um lado da cama seu filho mais velho já com a mão na coroa que estava em cima de uma mesinha, e do outro lado seu filho mais novo com a mão na espada já disposto a começar a brigar pelo reino. Médicos discutiam, os curadores de acotovelavam e os padres benziam. O  Rei então dirige as palavras ao seu Bobo que tentava anima-lo:
—Meu Bobo (e suspirou)...
—Às ordens, Majestade
—Majestosa é vossa graça (mais um suspiro) e merecido será vosso descanso (suspiro): de hoje em diante, não serás mais bobo de ninguém.
Logo após o Rei estende um papel para o Bobo pegar e ler chorando para toda a corte:
''Bobo passava a ser Duque da Santa Graça, com direito a castelo e terras, artistas e serviçais, povo e animais, podendo ele mesmo formar sua corte.''
—Vós—(o Rei suspirava )—vós déreis até ter vosso próprio bobo...
O Bobo fica com uma expressão de gratidão, e pede mais uma coisa ao Rei:
—Quero apenas que me permitas, Majestade, ser bobo ainda por mais um dia, mas na praça, no campo, para o povo!
Que seja—o Rei concorda com um sorriso e com o último suspiro.

Após o luto, de manhã na Praça o Bobo lá está cantando e gritando:
Hoje é dia de alegria!
Por mais dias que se faça
jamais se verá de novo
o dia em que, de graça!
um duque desce à praça
dançando e cantando ao povo!
Logo muitos estavam ali, cantando e dançando com o Bobo.( E assim foi o dia inteiro, com o Bobo cantando e dançando na praça.)
No dia seguinte, o Bobo volta ao Castelo Real e está diante dos dois príncipes.
—Chamamos o Duque à nossa presença—(o Príncipe Mais Velho fala)—para que se cumpra o último desejo de nosso pai.
O príncipe mais novo concorda:
—O Duque deve ter seu castelo e seu ducado, com terras e gente,animais e serviçais. Porém...
O príncipe mais velho interrompe e continua:
—Porém digo eu. Porém, o Duque há de compreender que não podemos colocar um desejo do Rei acima dos interesses do Reino. Muitos duques há que também querem castelos e ducados, de modo que melhor será que o Duque escolha o que nós para o Duque escolhermos. Afinal ( o Príncipe Mais Velho ri), o Duque foi bobo tanto tempo, não há de querer agora ser mais duque que os outros...
 o  Bobo responde:
—Ao contrário, Alteza, continuo muito mais bobo que duque.
Todos duques e serviçais ali presentes começam a rir e a cochicharem e colocaram que o Bobo passaria a ser chamado de Bobuque.
—Ótimo, (os príncipes falaram juntos e o Mais Velho apontou na parede o mapa do Reino) O Duque ficará então com o Castelo do Canto, todos seus móveis e pertences, suas lavouras e animais.
Os aplausos tomam conta das risadas. E o príncipe mais novo continua a falar:
—Também poderá o Duque cultivar todas as terras do ducado.
+ ( Todos riem, pois o castelo do canto fica em cima de um rochedo e não há como haver plantações).
O principe mais velho toma a palavra:
—Além disso (o Príncipe Mais Velho apontou, e todos debruçaram nas sacadas e janelões para ver)terá o Duque uma tropa de animais e um povo escolhido a dedo.
 + (Os soldados preparavam um rebanho de cavalos doentes, mulas magras e vacas velhas e um grupo de aleijados e cegos, velhos cansados e crianças órfãs ou doentes).
O principe mais novo pede silêncio no meio de tantas risadas e continua:
—Isso ainda é nada. Para que o Duque tenha uma vida alegre o resto de seus dias, reservamos o que de melhor tem o reino nas artes e diversões.
 +  (Apontou para um canto e todos riram de se dobrar: lá estavam três músicos surdos de tão velhos, um pintor um tanto cego, atores velhos).
Bobuque agradece e vai saindo. Um barão ainda grita:
—Se quiser passe na prisão e leve também alguns ladrões!
—Obrigado, senhor(Bobuque se curvou e sai)
Na Praça Bobuque encontra as crianças e os cegos e diz :
—Esperem aqui.
—Onde vai, senhor?(o Pintor perguntou e ele respondeu apenas:)
—Daqui por diante, me chamem Bobuque. (E desceu aos porões até a prisão).
Na Prisão pede para entrar. O Carcereiro ri e fala:
—Entrar aqui é fácil, difícil é sair. Quer falar aos presos? Fale à vontade: eles não ouvem mesmo mais nada...
Um ambiente feio, com mal ardor e nogento . Bobuque entra e fala:
—Bom dia.
—Aqui é sempre noite(uma voz saiu da escuridão)
—Pois vim convidar para que vivam novos dias: é livre quem quiser vir comigo!
Bobuque continuou a dizer:
—É verdade(Bobuque agachava diante dos homens), é verdade: terá perdão quem vier comigo, e será livre.
—Livre pra trabalharaté morrer? (a voz de novo) —Ou livre pra morrer guerreando pelo Rei nalguma terra distante?
—Nada disso (Bobuque procurava a falar) acreditem: serão livres para trabalhar para si mesmos, decidir por si mesmos.
—Quem garante? ( fala um homem)
Bobuque chega perto do homem e diz:
—Eu garanto.
Um outro homem aparece do nada e fala :
—Ele garante, vejam só... Sabem quem é? O Bobo da Corte!
O homem volta para seu lugar e fala:
—Eles nada mais querem a não ser morrer em paz. Não vê? Só eu ainda tenho forças para ficar aqui onde não chegam os ratos... Para os outros, tudo já está acabado, toda a sorte se foi, até a esperança é um luxo.
Bobuque observa aquele homem e logo repara que o conhece e fala para ele:
—Não reconheci por causa da barba, e a voz também mudou: escureceu. Você é o poeta que não agradou e foi preso.
O poeta cuspiu as palavras:
—Esta vida é engraçada de tão triste...
Bobuque  respondeu:
—Eu, se estivesse no escuro, não apagaria uma luz.
Bobuque para no fim do corredor e espera, logo alguns decidem segui-lo e vão com ele. Bobuque diz :
—Não tem importância o que fizeram, o importante agora era o futuro.
Sairam todos para fora e se concentraram na Praça. Bobuque acariciando um de seus burros, pencebe que as crianças, velhos e ex-prisioneiros estão com fome e toma atitude. Se dirige o salão de banquetes e fala ao principe mais Velho:
—Minha gente não tem o que comer, Alteza.
—Perdão, Duque (o Príncipe responde) mas, como vê, ainda não terminamos aqui; depois, pode pegar os restos.
Ao Príncipe Mais Novo Bobuque diz:
—Faz um sol forte, Alteza, e temos entre nós velhos e crianças.
—Reclamariam mais se chovesse, Duque (o Príncipe piscou para os comensais) Mas não se preocupe: já pensei no assunto. Reservamos para o Duque um estábulo inteiro!
Bobuque agradece e sai. Logo estão todos no então confortante estábulo, comendo restos e dormindo bem. Bobuque para tudo e fala:
—Me olhem nos olhos. Minha gente, eu não quis nem pedi. O destino casou nossas vidas e, como em qualquer casamento, mesmo que não exista amor, tem de existir respeito. Além disso, já que vamos viver juntos, que seja uma vida alegre para todos. Passei a vida fazendo rir, agora quero rir de tudo que fizer ou viver. Quando eu passar do portão deste castelo, continue comigo quem quiser; quem não quiser, será livre. Não prometo nada a não ser liberdade e não garanto qualquer conforto, só sei que vamos ter muito trabalho naquele castelo. Mas de uma coisa podem ter certeza desde já: todos trabalharão para viver, ninguém viverá à custa de ninguém.
—Viva o Duque! (alguém gritou)
—Vivamos todos (Bobuque emendou) E não me chamem mais de Duque. Ganhei a vida como bobo, virei duque sem querer. Bobuque parece ser mesmo o melhor nome para alguém assim, não?
—Obrigado, Bobuque. (disse o poeta)
—Então (Bobuque bate palmas e um cavalo relincha)faça como todos: trabalhe.
Todos começam a trabalhar para iniciar a viagem, carregando ferramentas e sementes. O Maneta ficou em um canto sem fazer nada,o Perneta diza ele:
—Faça alguma coisa, homem.
—Com um braço só, o que posso fazer além de me cocar? ( responde o Maneta)
—Pois então coce-se. ( diz Bobuque)
—Você não sente cócegas? (uma menina pergunta para o Maneta, e ele não responde.)
O Maneta fica cercado dos 3 meninos e 3 meninas maiores, e sem falar nada tenta segurar a vontade de se coçar, mas não consegue e se coça e após isso caiem na gargalhada. Um soldado que entra no estábulo os pergunta:
—Do que riem tanto?
—Rimos da vida. (responde o Poeta)
No dia seguinte partiram do Catelo Real, em rumo ao Castelo do Canto.

2º ATO - UMA LONGA VIAGEM
NARRATIVA: o caminho era longo, mas com uma grande determinação eles passavam por cada dia com mais animo. Por onde passavam deixavam dúvidas de quem eram, para onde iriam, por que estavam tão felizes... De vez enquando alguém perguntava:
—Por que seguem esse homem?
E respondiam:
—Porque nos deixou livres.
NARRATIVA: diante daquela alegria que contagiava sempre havia quem que queria segui-los e Bobuque sempre dizia que ''cada um sabe da própria vida'', e assim a caravana foi crescendo...
NARRATIVA:  por onde passavam iriam pedindo o pão de cada dia e cada povoado ajudava como podia...
NARRATIVA: em uma noite 7 ladrões que acompanhavam a caravana de Bobuque emn rumo ao castelo, entraram em ação. Roubaram uma das carroças. O soldado presente do grupo de Bobuque, assim que acordou deu por falta dela e resolver ir atrás dos fugitivos, mas Bobuque disse:
—Que chance a gente teria? Quem luta melhor entre nós, luta só com palavras...
—Passei a vida obedecendo a ordens (o Soldado estufou o peito)mas agora só vou fazer o que quero.
NARRATIVA: Bobuque começou a conversar com as crianças e descobriu que elas tinham nomes que tinham sido dados no Castelo ou mesmo antes. Eram eles: Cabelo de Fogo, Ratinho, Sardenta, Do-Meio, Loirinha, Curiosa. O Poeta decidiu que estava na hora de terem nomes de gente. A costureira que iria dar os nomes, ela pensou um pouco e colocou o nome do menino menor e mais atrevido de Sexto. Um outro menino recebeu o nome de Sabado o terceiro foi logo falando:
—Quero um nome bonito, não mais um dia, da semana. (A Costureira lamentou)—Domingo é nome santo, é o dia dedicado a Deus.
O terceiro menino fala:
— Então pode deixar Domingo.
—Nomes nada valem(o Poeta lembrou) Os reis mais sanguinários têm nomes de santos...
As meninas maiores atrás iam fazendo perguntasao Poeta:
—Por que borboleta gosta tanto de flor? (perguntava uma)
—Como que a flor vira fruta? (perguntava outra)
O Poeta olhou para uma das meninas, a que estava com uma flor na mão e disse:
—Teu nome, menina, podia ser Flor. Hem?
Ela correu colher para ele um buquê.
—Então (a menina maior pediu), eu não posso ser Fruta?
—Por quê? (pergunta o Poeta)
—Por quê?! Fruta dá pra gente comer! (a menina maior responde)
No meio de muita chuva e lama que tinha a menina sem nome pergunta:
—E quando vai sair o sol outra vez?
—Bem, sol podia sair a qualquer hora (ele olhou as nuvens) mas sol com céu azul só mesmo na primavera.
Ela suspirou:
—E quando é? Amanhã?
E assim o nome da terceira menina ficou Primavera.

A carroça roubada chega, com o Soldado ferido e um ladrão junto dele.
—Ainda bem que chegamos (disse o ladrão). Ele está bem ferido.
O soldado acorda, e o ladrão fala:
—Lutou de mãos limpas contra os seis!
—Mas não sozinho (o Soldado falou). Ele me ajudou.
—Por quê ? (perguntava Bobuque)
—Não sei. (lhe respondia o Ladrão)
Bobuque se referiu ao ladrão:
— Se quer nos seguir, terá que fazer algo. O que sabe fazer além de roubar? (Bobuque pensou) Então teve saber vigiar, virará o Vigia e Tesoureiro.

NARRATIVA: Alguns dias se passaram, e a curiosidade das pessoas nos povoados permaneciam:
—É verdade que são livres?
—Claro: vê alguma corrente, algum soldado? (algum personagem)
—Então por que não fogem?
—Para quê? E para onde? (algum personagem)
—Para onde vão então?
—Para o Castelo do Canto.Já ouviram falar? (algum personagem)
—Não...
NARRATIVA: as pessoas buscavam saber sobre o Duque, se aquele Bobo era realmente Duque...
—É verdade que seu Duque é um Bobo ?
—É verdade (algum personagem).
Bobuque falava em versos:
—Mas' existirá mesmo um duque assim? Sou o que sou e o que foi feito e mim: Duque da Graça por graça do Rei.

NARRATIVA: aos poucos começaram a ter noticias sobre o Castelo do Canto...
—Já estive lá certa vez quando um dos príncipes quis ser arqueiro. É preciso muita calma para aprender a lidar com arco e flecha  e no Castelo do Canto e tão calmo que mais parece um cemitério... (Disse um mercador)
—Mas o príncipe teria ido até lá só para aprender a flechar?  (Bobuque perguntou com uma dúvida).
—Por que não? Príncipes não viajam com cavalos velhos como vocês, e levam o conforto aonde vão: tendas, camareiros, ordenanças, cozinheiros... Além disso, não era tempo de maçãs, e os nobres adoram flechar maçãs nas macieiras; então o príncipe soube que no Castelo do Canto há muitas cobras e lagartos e foi até lá só pra treinar pontaria nesses bichos... (contava o mercador)
—Cobras e lagartos? (Um personagem fala) Mas que raio de castelo é esse?
—Que vocês esperavam duma terra seca como aquela? (continua a dizer o mercador) Mas o pior mesmo são as sombras...
—Que sombras?
O mercador contava como se fosse uma história:
—Na vizinhança vive tão pouca gente que se pode contar nos dedos, e ninguém fica no castelo depois que anoitece. O príncipe precisava de serviçais e ameaçou de morte aquela gente para continuar lá depois do anoitecer, mas acharam melhor morrer a ficar: contaram que nunca mais voltavam os que pernoitavam ali... Lá do vale, à noite viam sombras subindo pelo rochedo e entrando no castelo, e vagueando por lá a noite inteira, sombras enormes...
 —Vamos esclarecer isso (Bobuque disse) Sombras à noite?!
—Vi com estes olhos (o mercador se arrepia) e ouvi uivos a noite inteira. Esperava vender muitas coisas para a caravana do príncipe, mas passei todo o tempo pensando nas sombras, dormindo de dia e à noite acordado, como todos, cuidando para que os archotes não se apagassem com o vento, lá venta demais. E, depois de três dias, até o príncipe mostrou que também tinha medo, montou cedinho no cavalo como se fugisse de fantasmas. Na pressa, quase caiu no precipício: a estrada do rochedo é traiçoeira...
 Bobuque olha para todos, e ve o olhar de medo e trsteza neles. O Poeta diz ao mercador:
—Em todos os reinos onde estive, quanto mais escravo é o povo, mais são felizes os animais dos nobres: cachorros de colo, de caça, gatos, pombos, falcões, éguas de fino trato... Prefiro a liberdade, mesmo com cobras e lagartos.
Bobuque se dirige até uma carroça e fala:
—Já vi muitas sombras. A sombra balançante dos enforcados. A sombra de medo no olhar dos covardes. Crimes cometidos à sombra da Cruz. Nada mais me assombra.  

NARRATIVA: ao amanhecer foram acordados por soldados:
—Quem é o chefe da caravana? (perguntavam para eles)  Hem? Quem é o chefe?
—Sua Excelência o Duque da Santa Graça ( O Poeta se curva diante de Bobuque) E o chefe de vocês que é?
O Capitão se adiantou desconfiado:
—Duque? Não vimos nenhum estandarte, nenhum brasão...
—Nosso brasão está no coração  (o Poeta apontou uma foice espetada numa das carroças) E aquele é nosso estandarte.
—Duvido que seja mesmo um duque (um dos soldados diz)
—O risco será seu, Capitão (Bobuque encarou) Não estará o senhor se arriscando desde já ao nos acordar para nada?
—Em nome do Rei, Excelência (o Capitão se perfilou) Procuramos jovens para as tropas.
—Mas o Rei não está morto? Qual dos príncipes tem afinal a coroa? (diz Bobuque)
—Nenhum, Excelência, é por isso mesmo os dois procuram soldados para suas tropas. (Capitão)
—Então o Exército Real se dividiu? E de que lado está o senhor?
O Capitão olhou os soldados curvados por um cansaço de dias e noites:
—Estou ao lado de meus homens: se não levarmos um pelotão de recrutas, nosso batalhão será mandado para a frente da primeira batalha. Pelo Reino, Excelência, tem nessa caravana jovens em idade de servir?
—Ninguém, Capitão. Só velhos, crianças e doentes. (disse Bobuque).
—E no ducado, Excelência?( Capitão)
—Nessas carroças, Capitão, está toda a gente do meu ducado. (disse Bubuque).
NARRATIVA: O capitão se retira e continua sua jornada. Continua também a jornada em rumo ao Castelo do Canto.

NARRATIVA:  Castelo do Canto, estava escrito a faca no tronco de uma árvore.
—Vamos descansar aqui?(Bobuque perguntava)
—É o fantasma do enforcado! (alguém falou)
Foi uma correria: uns se agarraram aos outros, outros se agarraram a uns, as crianças menores já choramingando e os animais então mais nervosos.
—É o fantasma, é o fantasma! (um gritou)
—Vamos sair desta sombra! (outro gritou)
Bobuque, o Poeta, o Pintor e o mais surdo dos músicos não ouvem nada, pois estão cantando... Bobuque estão percebe e fala:
—Vê algum fantasma, Poeta?
—Sim; se fantasmas são brancos como dizem, vejo alguns ali em redor
daquela rocha...(diz o Poeta se referindo aos que tinham corrido)
—E você, Pintor, vê algum fantasma? (pergunta Bobuque ao Pintor)
—Ora, você sabe que não vejo muito bem, mas duma coisa tenho certeza: minhas mãos vão parando de tremer quanto mais longeficamos do Castelo Real. Então desconfio que não era só de velhice que eu tremia, mas também de fome e de medo... E firmou a voz:
—Agora, acho que vou voltar a pintar. (disse o Pintor)
—Mesmo sem enxergar bem? (Bobuque pergunta)
—Não enxergo mas ainda vejo cores. Não viu como as crianças perderam aquela palidez de doença? Estão coradas. Não vê que as feridas sararam em todos nós e até os aleijados estão mais ligeiros? Não ouve o Músico compondo? Vou pintar o pouco que vejo, o que ouço, o que sinto! ( respondeu o Pintor)
—E o medo? É possível pintar o medo, Pintor? É branco ou negro o medo?(Bobuque pergunta)
—Depende: hoje, pintaria gente se agarrando a uma rocha em pleno meio-dia, por medo de sombras e assombrações...( respondeu o Pintor)
E enquanto se levantavam para ir Bobuque disse ao Pintor:
—Hoje você pintou muito bem.

NARRATIVA: finalmente a chegada no Castelo do Canto.
—O castelo e todos seus pertences... (Bobuque sorriu com o olhar)—Aqui em cima não existem árvores, vamos precisar de todo pedaço de madeira para fazer camas, mesas e armários. Que tal a gente se preocupar agora com outras coisas?
—Que coisa é melhor que luz e calor?! (alguém disse) —E que móvel se pode fazer com isto?!
Bobuque desfiou uma corda para fazer barbantes, amarrou capim num galho e fez uma vassoura.E após isso disse:
—De gravetos podemos fazer uma vassoura. Das tripas podemos fazer coração! Não bastam só dois paus para fazer uma cruz? O que não faremos então com uma porção de paus?! Se vamos viver aqui para sempre, agora é hora de trabalhar enquanto temos luz! (disse Bubuque)
O Poeta concordando, fala:
—O homem é o inventor das invenções! Quem tem capim e pano tem colchões!
Todos começam a trabalhar e o dia vai acabando...
—Por que riem tanto? (o Perneta perguntou e depois ficou pensando
na resposta:) Achar serviço para manetas é mais difícil que para cegos;
você devia se dar por feliz de ter as mãos.
No quarto, já na hora de dormir, Bobuque sussurrou ao Poeta:
—Se tivermos de descer todo dia até o vale pra buscar água, não sei se vamos agüentar.
—Amanhã é outro dia(o Poeta disse) Por mim, mesmo que a gente tenha até de voltar, valeu: foi uma viagem pra dentro de mim mesmo. Não tenho mais medo de nada, meu amigo.

3º ATO - AS PRIMEIRAS GRAÇAS

NARRATIVA: o dia surge, o Poeta acorda e cameça a prestar atenção nos sons que vinham de fora do castelo... Acordou Bobuque bem baixinho dizendo:
—Escute...
NARRATIVA: foram até para fora do castelo, viram um trilho serpenteando pelo rochedo, enveredaram por ali e deram com um fio dágua cascateando entre as rochas. Ali nascia o riacho do vale, e pelo vale ecoaram os gritos:
—Ei, gente, ei! ( Bobuque grita)
—Venham ver! (Poeta grita)
—Venham beber! (Bobuque)
—Água corrente! (Poeta)

Bobuque após ter feito isso se coloca para pensar e chama todos na praça para falar algumas coisas:
—Ouvi uma voz, e ela me mandou dizer a vocês Os Sete Palpites da Vida Eterna.
—O Primeiro Palpite era que, nesta vida, só a morte é certa, além, é claro, dos imprevistos e das descobertas.
—O Segundo Palpite lembrava que o que passou, passou; ninguém pode adivinhar o futuro e, assim, a Eternidade é hoje.
—O Terceiro Palpite receitava perdão para curar o coração; e, para os males da alma, receitava nenhuma ambição.
—O Quarto Palpite dizia que ninguém é maior que o próprio tamanho, mas que vontade e trabalho removem montanhas.
—O Quinto Palpite ensinava que para trabalhar feliz só há um jeito: fazer com prazer e cada vez mais bem feito.
—O Sexto Palpite garantia que para a aventura é preciso coragem, mas que mudar a si mesmo é a melhor viagem.
—Finalmente, o Sétimo Palpite lembrava que a vida é mistério, a morte é segredo(e perguntava: então por que tanto espanto? para que ter medo?
Dois que ali estavam presentes se curvaram como se fossem rezar ...
—O que vão fazer? Rezar?! Então não ouviram nada! Temos é de encher este barril pra fazer o almoço, moer mais trigo, fazer mais camas e colchões e... (Bubuque continuou)
—Dar banho nas crianças (uma mulher pega uma bucha) antes que fiquem de novo com feridas.
—E procurar ovos nesses penhascos: ontem vi águias e gaviões (o Pedreiro pegou uma sacola).
O Soldado mostrou um pedaço de madeira, e disse:
—Se conseguir caniço para as flechas, com isto posso fazer uma besta, caçar alguns lagartos...
—Eu era sapateiro de infantaria antes de perder as pernas na guerra (o Perneta falou) e sei trançar couro: será que se pode trançar couro de cobras e lagartos?
—Se puder (um dos manetas disse) que tal fazer uma rede pra pescar no riacho? Se existe uma coisa que sei fazer é pescar!
Um camponês apontou o sol e nuvens:
—É época de plantio e vai chover logo. Por que não levamos sementes pra plantar no vale?
—Podemos voltar com a carroça cheia de terra (emendou outro) pra plantar aqui cebola e alho em canteiros.
—E batatas. Temos algumas batatas, não temos?  (disse um camponês)
As crianças já iam para a cascata, levadas por um dos manetas:
—Vou ensinar os maiores a dar banho nos menores. Sempre deram banho em mim, chegou a vez de ensinar...
  O Pedreiro fala:
— Com uma marreta, talvez abrisse uma valeta para a água descer diretamente ao castelo.
—Marreta não temos (o Ferreiro, bate uma espada na muralha) Mas olhem como isto é aço do melhor, achei ontem. Se me levarem até uma aldeia onde tenham uma forja, vamos ter mais de uma marreta...
—Podemos descer com os dois cavalos e deixar um pastando no vale, outro aqui em cima, na viagem seguinte trocamos. Assim, sempre teremos um cavalo descansado e forte. (alguém dizia)
—Por falar em trocar, podemos trocar essas vacas por cabras na aldeia. (outro dizia)
No fim do dia enquanto Bobuque consertava uma mesa quando o Poeta cutucou piscando:
—Escute, ouviu mesmo a tal voz?
—Claro (Bobuque piscou também)
Acenaram e deram até amanhã... no dia seguinte um das carroças chegam cheios de mantimentos, o camponês que está nela conta:
—Os príncipes estão brigando pelo Reino.
Contaram que coletores de impostos andavam pelas aldeias:
—Coletores de impostos estão andando pelas aldeias  e agora cobram em dobro: primeiro ara um príncipe, depois para o outro. De nós levaram duas cabras. E estão de novo recrutando soldados, mas sabem que só temos velhos e crianças. (diz o camponês)
Todos que tinham saido para plantar voltaram cansados, mas alegres.
—Plantamos toda semente que levamos, um pouco aqui, um pouco ali. (disse outro camponês) A terra é pouca mas é boa, em manchas. Mas que cheiro é esse?
Uma sopa fervia na cozinha...
NARRATIVA: o tempo ia se passando, o trigo já tinha sido colhido pela primeira vez, já havia sido plantado pela segunda vez, se passou outono, se passou inverno ... e assim o tempo passou...

4º ATO - AO REI O QUE É DO REI
NARRATIVA: plantavam e o vale ficava mais belo a cada dia, porém havia que de vez em quando alguns plantações eram roubadas. Mas não concondaram quando o Soldado quiz vigiar as plantações à noite.
—Deus cuida (Domingo falou a todos)
—Muito bem(  Sexto falou com o arco numa mão e uma flecha na outra) Muito bem. Mas, se Deus não cuidar muito, não seria melhor a gente cuidar um pouco?
Sábado opinou:
—O tempo dirá. Deixar que roubem é melhor que nada ter, e talvez seja nosso jeito de pagar imposto...
NARRATIVA: os rapazes já tinham começo de bigode, as três meninas já eram moças. 
Um dia pararam em uma aldeia e pediram pão, mas após comerem o teberneiro disse:
—Não, Não quero mais maçãs, quero dinheiro.
Sábado disse :
—Não temos dinheiro.
—Que é que estão esperando? Comeram meu pão, não? Agora, quero meu dinheiro! Cocem-se!  Eu, se fosse vocês, não ficava tão tranqüilo...
—Não usamos dinheiro, o senhor sabe, nunca foi preciso ( Sábado falou calmo como sempre)
Mas o taberneiro engrossou mais a voz:
—Pois agora é preciso! Não pedi maçãs, não quero maçãs! Ou pagam com dinheiro ou com trabalho! Como é seu nome, rapaz?
—Sábado, senhor. (responde Sábado)
Os homens riram mas ele continuou calmo falando:
—Que trabalho podemos fazer?
—Muito bem, senhor Sábado (o taberneiro disse) Pão se assa com lenha, sabia?
—Peguem duas braçadas de lenha na carroça  (Sábado falou baixinho, mas Sexto falou alto:)
—Por que duas braçadas? Uma deve pagar até mais de um pão! O
taberneiro riu e respondeu:
—Você não perguntou o preço do pão: tem de pagar o que eu pedir! Quero toda a lenhada carroça.
—Não!(Sexto disse encarando)
Sabado de uma forma calma disse ao homem:
—Bom pão. Mas, por melhor que seja, foi feito de um punhado de farinha, num forno com todos os outros pães. Não será muita lenha por um só pão, senhor?
—Pague, rapaz (uma voz de bebado disse) Somos testemunhas: você não perguntou mesmo o preço...
—E deve estar devendo muitos pães que pagou até hoje com maçãsn (um bebado disse.)
Tinham dois soldados. Um levantou da mesa e se postou na frente de Sábado:
—Vai pagar ou não vai? (disse o soldado)
—Não! (disse Sexto)
—Chamem o Duque. (disse Sabado)
—Mas a carroça fica! (solldado boquejou)
—Muito bem, a carroça fica. Mas o pão será pago por nosso duque. (disse Domingo)
—Vosso duque?! ( o soldado falou e todos os homens riram.)
—Com licença (Sábado saiu).
Domingo monta no cavalo, Sexto e Domingo ficam parados e um deles diz:
—Pode ir, nós ficamos aqui.
—Fiquem com Deus.(Domingo falou)
—Ele está sempre com a gente (Sábado disse)

Em um momento mais tarde, enquanto esperam por Bobuque os que estavam ali no bar debochavam dos meninois:
—Espere sentado, rapaz! ( dizia um)  Veremos como o seu duque...(riam) como o seu duque paga uma dívida: fazendo caretas? Contando piadas?
—Ou dinheiro ou a carroça de lenha (o taberneiro dizia)
Um soldado desembainhou a espada, mas Sabado continuou quieto e calmo.
—Não tem medo, infeliz? (disse o Soldado, mas ele continuou quieto)
—Responda! A ponta da lança tocou o pescoço do rapaz, mas ele não se mexeu. ( O soldado disse)
—Deixem o menino em paz (disse um mendigo)
—Olhem só quem fala: vive de catar o que sobra das mesas, mas defende quem me deve... Por que não vai também viver no castelo do "duque"? ( disse o taberneiro ao mendingo)
Rindo, pegam o homem pelas pernas e braços, e o jogam em cima da carroça.
—Eu iria mesmo (diz o mendingo, já saindo da carroça) Iria mesmo, se soubesse fazer alguma coisa...
—Então fique aí  (Sábado diz baixinho) Sempre se pode aprender alguma coisa.
—O rapaz é valente... Mas talvez devesse dobrar a língua, não? ( disse um soldado)
—Sabe lutar, rapaz?—( o soldado mais forte disse) Hem?
—Eu posso aprender (Sexto surge da noite com um cacete na mão.)
Rapidamente, Sábado puxa a lança do outro soldado e aponta para o peito do grandalhão:
—Jogue fora a espada.(disse Sabado para o grandalhão)
—Jogue esse cacete. Faz tempo você quer lutar, não? ( Disse para sexto) Pois bem: agora lutem, mas sem armas.
Então eles lutam até os dois soldados ficarem no chão, até que por fim chega Domingo em um cavalo e diz a todos:
—Bobuque mandou pagar mas pediu recibo.
—Recibo? (o taberneiro ficou com duvida) Pra que recibo?
O menino tira da sela um pedaço de pele com a letra do Poeta e diz:
—Para que no Castelo Real saibam quanto custa um pão por aqui. E, se não souber assinar, senhor, faça sua marca a fogo nesta pele. É o que quer o Duque.
O taberneiro chama a um canto os soldados:
—Mas ele pode fazer isso?
—Bem, é bobo mas é duque, não é? (um dos soldados diz)
—Talvez não seja tão bobo...( diz o outro soldado)
—Melhor esquecer esse pão. ( afirma o taberneiro)
Domingo encara os ali presentes e diz:
—O que resolveu, senhor? O Duque me disse para não demorar.
Então o taberneiro respondeu:
—Esqueçam esse pão!
Pegam a carroça e partem, o taberneiro com raiva diz:
—Escute: se eles não usam dinheiro, como é que pagam impostos?
—Pois é... Deviam receber umas visitas, não? (diz um dos soldados)
—Moleque atrevido (o taberneiro fala com raiva)
NARRATIVA: No castelo, todos esperavam. Quando chegaram.              Naquela noite Bobuque  falou sério:
—Eu já esperava por isso. E tudo aconteceu e foi resolvido pelo mesmo motivo: aquela gente tem uma coisa que vocês não têm, por isso ficam com inveja. Deus tenha piedade de vocês.
—Como podem ter inveja duma coisa que não temos? (Sexto dizia)
—E que coisa é essa? (Sábado tembém tinha duvidas)
—Descrença (Domingo arriscou responder)
Então disse o Poeta:
—O medo. Por isso, tenham calma com a própria força, paciência, com a violência e piedade com os violentos, porque o que eles têm é medo, e vocês não.
Fruta começou a cuidar de Sábado, que estava ferido e disse:
—Está doendo?
—Claro. Mas parece que um bom soco faz a gente ver melhor... ( respondeu Sabado)

Em muitas noites Sexto ficava na muralha olhando para o outro vale, e um dia perguntou a Bobuque:
—Por que também não pegamos lenha lá que é mais perto?
—É outro reino, e já temos sorte de ser esquecidos por um rei. Não vamos lembrar a outro que existimos, ou se lembrarão de cobrar impostos.(Bobuque respondeu)
Sexto fez outra pergunta:
—Por que não usamos dinheiro?
Bobuque então respondeu: 
—Espero essa pergunta há muito tempo. Até agora, trocamos os frutos do trabalho pelas coisas de que precisamos. Mas somos velhos, precisamos de tão poucas coisas... Não temos o direito de exigir que vivam como vivemos. Se quiserem, comecem a trocar por dinheiro a comida que sobrar.
—E depois (o Poeta continuou) troquem por geléia o dinheiro das maçãs, e por pão o dinheiro do trigo, e comprem casacos feitos com as peles que venderam... Dinheiro é uma cadeia que prende a gente no vício de vender e comprar.





NARRATIVA: Um dia,Domingo trouxe notícia das festas de Páscoa: gente de várias aldeias iria à missa, que o bispo em pessoa rezaria na maior das aldeias; até já enfeitavam praça e todo dia chegavam músicos e acrobatas, carroças de teatros e mascates.
—Vamos levar trigo para os pobres (disse Fruta no jantar, mas os velhos já negaram:)
—Tempo de muito,véspera de pouco. E podem estranhar tanta generosidade...
Domingo então falou:
—Pensando bem, já temos salões cheios de trigo, despensas cheias de charque e conservas, engordamos de comer ovos todo dia, enquanto, lá embaixo, existem crianças que nunca comeram um ovo inteiro...
—Vamos levar ovos cozidos para as crianças (Primavera disse e bateu palmas para a própria idéia, e Sábado apoiou:)
—Por que não? Não podemos armazenar ovos, não?
Os velhos concordaram:
—Ovos, levassem alguns. Mas trigo não! Ninguém dá trigo. Vão pensar que somos ricos ou perdemos o juízo...
—Podemos levar pães (a Cozinheira falou) Pães recheados com lingüiça, toucinho,pães de mel...
Flor emendou:
—E, já que os ovos serão para crianças, podemos cozinhar, colorindo com casca de cebola ou de beterraba!
—E nós não podemos tocar alguma coisa por lá? (o violeiro disse)
—Recebemos saúde, alegria e paz. Então é tempo de dar! (disse Bobuque)
NARRATIVA: no Domingo de Páscoa saíram antes do sol com as carroças cheias, os moços e as crianças maiores a pé, os cavalos arcados de tanta carga mas também nervosos de tanta alegria. Era a primeira festa da vida deles fora do castelo.
—Dancem! (Bobuque dizia mas as moças se encolhiam)
—É mesmo hora de nossas moças aprenderem a dançar... (disse o Poeta para o Perneta)
Um cavaleiro se aproxima de Fruta e diz :
—Achei!...
—O capacete, senhor?( seu escudeiro perguntou)
—Não (diz o Cavaleiro) Achei aquela que tanto procurei.
—Eu também acho que achei o que precisava (o escudeiro diz engolindo pães e salames na carroça)
o Cavaleiro se curva diante de Fruta como num salão de baile:
—Conceder-me-ás esta dança, senhora?
—Conceder-me-ás? Que quer dizer? (respondeu Fruta)
—És pura como uma pérola (o Cavaleiro oferece o braço)
—Não sei dançar(responde ela)
—Nem eu ( falou o Cavaleiro e dançaram)
Mas tarde, Sexto perguntou ao escudeiro:
—Por onde vocês andam?
—Meu senhor anda por todo o Reino, procurando uma donzela para sersua senhora. Parece que achou. ( respondeu o escudeiro)
—Ora, pensei que ele procurasse aventuras, como dizem dos cavaleiros.(falou Sexto)
—Quando se anda pelo mundo (o escudeiro disse) não é preciso procurar aventuras: elas aparecem até demais.

NARRATIVA Quando acabou a comédia, foi dando cestas de ovos para as crianças dos camponeses; e pães para os mendigos, um salame para cada família, geléia para as moças.
— São presentes do Bispo? (perguntavam alguns ali presentes)
—Não (Primavera dizia) São presentes diretamente do Céu.
Na taberna, dois coletores de impostos cochichavam:
—Então é mesmo verdade. O tal castelo tem tanto que se dão o luxo de dar... (dizia um)
—Se não usam mesmo dinheiro, precisamos ir de carroça até lá: salames como aqueles ficarão muito bem na minha adega... ( dizia o outro)
O ajudante do Bispo se dirigiu a Bobuque e disse:
—Falo ao Duque da Santa Graça?
—Mais engraçado que duque, às suas ordens. ( respondeu Bobuque)
—Não minhas mas do Bispo: que vossos presentes sejam entregues ao bispado, para que deles faça o uso que melhor aprouver ao Senhor Deus.
—E o Bispo tem certeza do que Deus quer? (o Poeta respondeu)
—Essa gente não deve experimentar o que não pode ter (o padre disse de voz baixa)
—Pão? Não foi pão que Jesus deu aos apóstolos na última ceia? E não foi pão e peixe que ele multiplicou para a multidão? (o Poeta falou alto, gente começou a juntar em redor)
—Meus respeitos ao Bispo (Bobuque disse) mas não posso fazer sua reverendíssima vontade: já demos tudo que trouxemos.
—Que isso não se repita ( padre falou e depois virou as costas e saiu)
NARRATIVA: O Bispo jantava numa mesa reservada. Na mesa ao lado, os coletores apuraram os ouvidos quando o padre contou a conversa com Bobuque.
—Não perdem por esperar... (o Bispo disse com raiva)
NARRATIVA: Na praça, a gente do castelo já montava nas carroças quando o cavaleiro ajoelhou diante de Bobuque e disse:
—Minha espada a vosso serviço, senhor.
—Agradeço sinceramente, mas preferia uma foice. (respondeu Bobuque)
—Porém peço permissão, senhor, para gozar algum tempo de vossa hospitalidade, prisioneiro da vontade de uma de vossas donzelas. (disse o Cavaleiro)
—Você quer mesmo? (Bobuque pergunta e nem espera a resposta de Fruta, o olhar dela brilhava, e ele deu uma boa olhada no cavalo) Afinal, se não precisamos de espadas, um cavalo a mais sempre é bem-vindo...
O escudeiro ergue os olhos para o céu e fala baixinho ao cavalo:
—Lá vamos nós de novo...

NARRATIVA: e voltaram para casa. Na manhã seguinte quando o cavaleiro acordou, todo o castelo já cheirava a comida do almoço. O cavaleiro explicou a Bobuque que trazia um cansaço muito pesado, mas estava pronto a servir e...
—Seu cavalo já está nos servindo muito bem: desceu ao vale para trabalhar. Quanto ao senhor... ? (lhe disse Bobuque)
—Dom Carlos Felipe de Castelay Bourbon Aguillar dos Santos Silva, às suas ordens, senhor! (disse o Cavaleiro)
—Muito bem, a ordem é: pare de andar com essa espada que me deixa nervoso. Relaxe. ( diz Bobuque)
Dom Carlos Felipe olha para Fruta a arrancar ervas daninhas da horta e diz:
—Como descansar se o coração me assalta, senhor? (E ajoelhou) Peço-vos a mão de vossa gentil Fruta.
—Só a mão? Fique com a moça toda, se ela quiser  (responde Bobuque)
—Por ela desafiarei todos vossos inimigos, senhor (Dom Carlos falou)
—Agradeço de coração mas não tenho inimigos, a não ser umas pulgas no colchão. No entanto... (respondeu Bobuque)
—Sim, meu senhor. Ordene. (falou Dom Carlos)
—Como, por licença real, é direito meu conceder ou não o que me pede, testarei seu amor com um desafio mortal. (lhe disse  Bobuque)
Então Dom Carlos disse a Bobuque:
—À vossa vontade, senhor, estarão meu coração e minha espada!  Não será preciso tanto, mas decerto precisará de mais habilidade que qualquer cavaleiro até hoje. Enfrentarei exércitos se preciso for, escalarei montanhas, domarei leões. Mais ainda: passará três dias e três noites sem nada pedir a alguém e nad aaceitando de ninguém. Vossa vontade será cumprida, senhor.
—Veremos, veremos. (Bobuque respondeu)
NARRATIVA: o almoço foi servido para todos, menos para Dom Carlos Felipe, Bobuque ainda liberou cebola para Dom Carlos comer nos três dias.  Dom Carlos chegou perto de Fruta e ela lhe disse:
—Que hálito! Você vai passar os três dias comendo só cebola?!
NARRATIVA: O cavaleiro se envergonhou, saiu do castelo pisando duro. Olhou os penhascos, decidiu por um caminho e começou a escalar. Enfiava o punhal nas gretas para se apoiar e ia resmungando:
—Se os meninos conseguiram, você vai conseguir, vá em frente, e não olhe para baixo! Morrer só acontece com quem está vivo. Vá em frente!
Lá do castelo os meninos olham e conversar:
—Por que ele escolheu o caminho mais difícil? (perguntou um)
—Cavaleiros devem ser assim. (respondeu outro)
NARRATIVA: Lá no alto, Dom Carlos Felipe parava para mascar as plantas que achava, fazia caretas e dizia para si mesmo:
—Com sal e azeite até não seria mal...(decidiu pegar mais mantimentos) Vá em frente, você vai ter de comer amanhã também.
Viu que quando chegou em cima os meninos já estavam lá  e perguntou:
—Como é que conseguiram? Não, não me digam, não posso pedir nada. Vocês não têm medo de subir até aqui?
—Subir não é tão difícil, pior é descer.

NARRATIVA: mais tarde quando já tinha ''se virado'' para se alimentar, Bobuque chegou diante dele e e disse:
—Parabéns: venceu o primeiro dia.
NARRATIVA: Dom Carlos dormiu na cocheira com o cavalo. De manhã, avivou o fogo e ferveu um chá de capim, depois tornou a escalar os penhascos. Voltou com mais ovos, plantas e cogumelos. E já tinha de catar mais lenha, avivar de novo o fogo, cozinhar; não tinha tempo nem para cuidar da barba, os cabelos estavam emaranhados de capim, as roupas rasgadas e sujas. Mas com mais amor no olhar, Fruta trazia mais cebolas. No terceiro dia, Dom Carlos Felipe já descascava e cortava as cebolas com rapidez, já sabia quais verduras do penhasco eram comestíveis, já tinha feito uma colher de pau e conseguiu tomar sopa quente. No Quarto dia já cumprido sua promesa ele sentou no refeitorio e falou:
—Foi a mais dura batalha que já enfrentei até hoje( confessou Dom Carlos)
—Agora temos certeza—Bobuque explicou—Se sabe cuidar de si, saberá cuidar dela.
NARRATIVA: Assim brindaram aos noivos com canecas de leite.

NARRATIVA:
Um pouco mais tarde avistaram alguém chegando no Castelo. vinham em cavalos com o brasão real nos peitorais, uma carroça vazia e uma patrulha; o soldado grandalhão com o estandarte.
—Água! (disse o grandalhão). Água e feno para os cavalos!
Esperam, mais nada acontece. Então o grandalhão fala:
—Como?! Ninguém cuida dos cavalos?!
—Quem monta, cuide (Bobuque falou) Sejam bem-vindos! O bebedouro é ali, a cocheira lá. A que devemos a honra da visita?
Um soldado responde:
—Com os cumprimentos do Rei, senhor, viemos coletar os impostos. Mas preferimos fazer os cálculos na sombra...
Entrão no refeitório, todos do Castelo tembém entram, o Soldado mais magro diz:
—É costume tratar esse tipo de assunto em particular, senhor.
—E o vinho? Não tem vinho?( reclama o Soldado gordo)
—Não temos segredos (Bobuque faz gesto e surge dois copos de vinho.
—Só? (o Gordo reponde após olhar)
—Temos muito pouco (disse o Poeta) Ainda estamos só na segunda safra das vinhas.
O Magro tira uma pena e papel de um estojo e começa a anotar, e diz:
—Os impostos, o Duque sabe, são cobrados por quantidade de servos. Quantos são?
—Todos aqui presentes, mas não precisa contar. Não usamos dinheiro.
—Neste caso (o Magro respondeu) a ordem é coletar trinta por cento do trigo e dos animais... e do vinho, óleos e charques, conservas e peles.
—Trinta por cento?! (o Poeta diz) Trinta por cento?!
—Só trinta por cento (o Gordo e o Magro falam juntos)
—Mas temos só dois cavalos!( fala Sabado)
—Levaremos o mais novo.(responde o Magro)
 —Duas safras pra encher dois barris de vinho e...(diz Sexto)
 —Espero que tenham também um barril vazio para levarmos a parte do Rei(interrompe o Gordo)
—Eles podem mesmo fazerisso, Bobuque?! ( pergunta Sabado a Bobuque)
—Quem vai impedir? (respondeu Bobuque)
—Vamos aos armazéns, senhor? (pergunta o Magro a Bobuque)
NARRATIVA: os soldados começaram a encher as carroças, quando Dom Carlos Felipe chegou e do portão já foi falando:
—Parem em nome do Rei!
Os soldados pararam mais por espanto que obediência, e o Grandalhão disse)
—Quem diabo será o imbecil?
—Dom Carlos Felipe de Castela y Bourbon Aguillar dos Santos Silva. Cavaleiro da Guarda Real, com autoridade sobre soldados sem comando e funcionários em delito.
—É delito coletar os impostos do Rei? (o Magro pergunta ao Gordo)
—Delito é não pagar ao Rei o que é do Rei(responde o Gordo ao Magro)
—Dez por cento (Dom Carlos disse em voz alta) Não mais que dez por cento, ou juro que terão de se explicar ao próprio Rei.
—Ora (o Grandalhão fala) quem garante que é mesmo um cavaleiro?
—Minha espada (Dom Carlos fala e estende a mão e um menino correu e trouxe a espada para ele) Em guarda!
—Deixem comigo... (O Grandalhão sorriu e avançou confiante, mas num instante é desarmado e encostado na muralha pela espada do cavaleiro. Os outros soldados embainharam as espadas, obedeceram quando Dom Carlos ordenou:
—Só dez por cento dotrigo, o resto devolvam. Levem também o barril de volta, as conservas e os charques. O Rei não é tão miserável. E o que fazem aí essas cabras e o cavalo? O ducado ainda não tem dez cabras, não pode pagar o dízimo.
—Levaremos então os cabritos (o Magro falou)
—Dois, não seis. Desamarrem quatro. E depois desapareçam antes que eu perca a paciência.( disse Dom Carlos)
NARRATIVA: os soldados obedecem e quando montam para ir embora, Dom Carlos toma as rédeas da carroça e diz:
—Não sem antes dar recibo( O Magro escreveu sem sair da sela; assinou, carimbou o selo real) Boa viagem ! E lembranças ao Rei.
Saiem do portão um falando com o outro:
—Ele será lembrado disto sem dúvida (Gordo falou ao Magro)
—E também o Arcebispo (o Magro disse) deverá saber que há no Reino um castelo onde não se vê um altar, nem mesmo uma cruz.
—Também não esquecerei de contar que há rapazes em idade militar...Não perdem por esperar... (disse o Grandalhão)

NARRATIVA: Mais tarde naquele dia, Dom Carlos se dirigiu a Bobuque e disse:
—Quanto tempo terei que esperar por Fruta?
—Esperar por quê? (respondeu Bobuque) Casem-se antes que se arrependam!
—Mas não é costume, senhor...(Dom Carlos fala)
Bobuque interrompendo fala:
—Os costumes, meu caro, são como os ventos: ventam em todas as terras mas sempre diferentes e mudando sem parar. Quando eu era bobo da corte, viajantes contavam de costumes tão estranhos que espantavam mesmo os cavaleiros mais viajados. No entanto, a gente dessas mesmas terras também estranhava os costumes daqueles viajantes... Que seja então um tempo de novos costumes.
Fruta pega a mão do noivo, leva ao peito e diz:
—Sente? Por que esperar se o coração quer?
—Tenho de avisar o Rei, a corte... (Dom Carlos Felipe fala)
O Poeta declama para Fruta:
—E, se não é meu teu coração de fruta, é meu desejo que seja feliz tanto quanto eu quis, mais do que comigo seria.
—Serei, prometo (Fruta respondeu) De outro jeito viver, não vale a pena.
O escudeiro chegava com o cavalo, Dom Carlos Felipe desembanha a espada e ajoelhando diante de Bobuque disse:
—Se um dia precisar, senhor...
—Ora, você não perde mesmo essas poses ?!(interropau Bobuque)
 NARRATIVA: Todos ali se despedem de Fruta, ela e Dom Carlos foram viver a vida.

5º ATO - A DEUS O QUE É DE DEUS
NARRATIVA: Naquele tempo, os ratos causaram pestes que mataram até mais da metade do povo em muitos reinos, mas ninguém desconfiava dos ratos: para uns, a peste era coisa do Diabo; para outros, era castigo de Deus. De qualquer modo, morrer era o que mais acontecia nos castelos e aldeias onde chegava a peste; e mesmo cidades chegavam a ficar vazias degente e cheias de cadáveres roídos pelos ratos, que assim mais e mais aumentavam, viajando em bandos pelos campos, levando a peste a todos os horizontes. Invadiam uma aldeia sem que ninguém notasse; à noite, iam se enfiando pelas frestas, ocupando os porões e os sótãos, comendo com fome de viagem tudo que achassem, desde a palha dos colchões até os dedos das crianças. E de um dia para o outro,, aparecia a peste; primeiro uma febre, depois vômitos, enfim inchaços no pescoço, nas axilas; e a morte. Os mortos eram queimados em pilhas no campo; os vivos andavam com lenços amarrados no rosto; pensavam que a peste viajava pelo ar, e assim evitavam os ventos e se trancavam em casa, mas de trancavam com os ratos. Queimavam também as casas dos mortos, crentes de que assim queimavam a peste, mas os ratos fugiam antes, iam para outras casas, outras aldeias. Afinal, com tanta peste e tantas mortes, quem ia se importar com ratos? Nas igrejas, ladainhas varavam madrugadas e, nas casas, gente se trancava nos quartos durante semanas. Outros vagavam feito fantasmas pelas ruas, esperando ser tocados pelo dedo de Deus ou do Diabo e, assim escolhidos, arder em febre e morrer em êxtase; pois até acreditavam que tanta mortandade fosse caminho para a vida eterna, assim se consolavam. E, como os ratos, vagavam em bandos pelos campos, seguindo alguém que empunhasse uma cruz e prometesse salvação pelas penitências do sofrimento. Outros, chefiados por soldados que viravam bandidos, saíam a saquear e pilhar, matando antes que a peste chegasse para matar mais, mais dispostos a morrer por flecha ou espada do que acabar abandonados em febre numa cama. No Castelo do Canto, não havia a tal da peste.
Um dia uma tropa chega, e é anunciada pelo Frede:
—Em nome de Deus, vos anuncio a visita de padre Arcanjo, enviado por Sua Reverendíssima, o Arcebispo, por sua escolha pessoal e com sua toda confiança, para que aqui verifique os mandamentos divinos, o andamento da fé e os costumes ditados pela Santa Madre Igreja!
Todos chegam e o Frede volta a recitar:
—Ajoelhem-se todos diante daquele que representa Sua Reverendíssima e encarna a Santa Madre Igreja!
Todos de ajoelham pórem só com uma perna, como fez Bobuque. Assim o Frade diz:
—Que ambos vossos joelhos demonstrem a inteireza de vossa fé e a disposição para as penitências.
Bobuque colocou também o outro joelho no chão e todos imitaram, menos o Poeta. Padre Arcanjo passa por todos, olha tudo e diz:
—Nenhum crucifixo... Não haverá um cristão por aqui?
—Somos todos cristão, padre (Bobuque respondeu) mas tão pobres que nunca podemos ter Cristo em ouro ou prata no peito.
—E onde oram? Terão ao menos capela? (perguntou o Padre)
—Quem dera, padre. Mas nossa pobreza é tanta que...
—Ora (padre Arcanjo penguntava) não têm ao menos um altar?
Estendeu a mão para Bobuque beijar
—Nossa fé é nosso altar (disse Bobuque e beijou engolindo seco a mão do Padre)
—Inconcebível. In-con-ce-bí-vel... Terei de relatar isto a Sua Reverendíssima.
Só o Poeta não passa pelo beija-mão, mas foi caçado pelo olhar do padre e cochichou a Bobuque:
—Não me peça que...
—Exijo (Bobuque ordenou o Poeta)
O padre entra no salão e pergunta:
—Os aposentos ?
—Não recebemos visitas, mas num instante arrumaremos um quarto com conforto.
—Vinho, água quente e fria, salame, pão, ovos quentes e queijo (o Frade recitou a um olhar do Padre) E toalhas brancas.
—Não temos toalhas brancas mas...(Bobuque respondia) daremos um jeito, daremos um jeito.
NARRATIVA: E começaram a trabalhar, Bobuque dava ordens irritado. Os soldados falavam com Sexto e Domingo sobre o Frade que estava quase desmaiando por falta de água:
—O padre ainda vai matar esse coitado...(disse um)
—Não deixou que bebesse desde a última aldeia, "pra fortalecer a fé"... (disse um outro)
—E Deus tenha piedade de vocês (um soldado falou aos dois moços)
—O padre vem disposto a santificar este castelo (disse o primeiro) preparem-se pra muito jejum e penitência.
—E dêem graças a Deus se ninguém for mandado à prisão (disse o segundo)
—Calem a boc a(o mais velho dos soldados falou) ou acaba sobrando castigo para nós também.
Domingo, Sexto, o Poeta e Bobuque conversavam:
—Acreditem. Não vivemos num tempo de ideais: a realidade é que o poder da Igreja é tanto ou maior que o do Rei, e a piedade menor. (disse Bobuque)
—Ora, você se humilhou diante do homenzinho...(disse o Poeta) E me obrigou a beijar aquela mão que decerto nunca mexeu uma palha em toda a vida!
—Mas basta que aquela mão pegue a pena, meu amigo, e escreva um relatório ao Arcebispo, ou aponte um dedo comandando os soldados, e pronto: pode ser a prisão ou até a morte para você, para mim, para todos nós! Não se esqueça que sou o menos duque dos duques, e este é o mais esquecido ducado do Reino... (disse Bobuque)
—E o que vamos fazer? (Sábado perguntava)
—Vamos agradar o homem e mostrar que tememos a Deus—(disse Bobuque) Afinal, depois de tudo que passamos, não custa ralar um pouco os joelhos, não?
Domingo completou:
—Pois se demos ao Rei o que era do Rei, é hora de dar um pouco a Deus.
—Gostaria que Ele cobrasse diretamente (Sábado fala)

O Frade acorda após um belo sonho, e se dirige a Bobuque:
—Quando chega de viagem, padre Arcanjo só sai do quarto pra jantar. O padre Arcanjo estava apenas recuperando as forças e, depois da janta, ia começar uma novena. ( e continuou) E, como temos pouco tempo antes de visitar outros lugares, não será uma novena em nove dias mas em três: rezas pela manhã, à tarde e à noite...
—Por quê? (Domingo perguntou)
—Por quê, meu filho?! Ora,quem sabe por quê?! Porque assim querem, assim mandam, assim fazem. Sou apenas um frade e apenas obedeço, agradecendo a Deus por ter apenas de obedecer. (disse o Frade)
—Temos que trabalhar, como rezar dias e noites? Até hoje, só paramos de trabalhar pra festejar, um só dia.
O Frade coloca a mão na boca do rapaz, olhou em voltae disse:
—Cuidado! Nunca mais diga isso, filho, especialmente enquanto padre Arcanjo estiver por aqui: você decerto receberia uma penitência tão pesada que... nem quero pensar.
Domingo sem baixaer a voz disse:
—Mas festejar não é uma forma de agradecer a Deus, Frade? Levamos pão para os pobres, e ovos para as crianças e...
—... e padre Arcanjo diria (o Frade interrompeu) que decerto estavam com a consciência culpada e que subornavam a Deus com restos de comida. Ele costuma dizer que o Mal está em tudo e em todos se olhamos bem; e que, se não olhamos o tempo todo, o Bem sempre vai mal.
Domingo pensou e respondeu:
—Mas então não há salvação para o Bem...
—Fale baixo, filho, ou nem fale! Bem ou mal, essas coisas só devem ser discutidas pelos entendidos, os que estudaram Teologia e Ontologia e outras "logias" como o padre Arcanjo. Não se atreva nem a pensar nessas coisas, que eles adivinham pensamentos. Apenas reze, filho, reze muito enquanto o padre estiver aqui, reze sem descanso nem economia, que está rezando pela própria vida... (disse o Frade)
Sábado apareceu na porta e disse:
—Mas o que estão fazendo ainda por aqui? Temos muito que fazer no vale!
—Hoje não vamos trabalhar. E façam silêncio em todo o castelo. (respondeu Bobuque)
—Mas há tanta coisa por fazer, Bobuque! E por que silêncio?!  (disse Sábado)
—Faça o que ele diz, filho, ou nunca mais fará nada. (respondeu Frade a Sábado)
—E faça silêncio sim, senão o padre acorda com enxaqueca e...(respondeu um soldado)
—Deus nos livre (disse o Frade e fez o sinal-da-cruz) e me perdoe, Senhor, falei sem pensar.
NARRATIVA: O Frade de ajoelhou e começou a rezar. A tarde passou e a noite chegou. Até que porta do quarto do padre Arcanjo abriu e ele disse, Banho. O Frade o ajuda no banho. Vendo o Frade tirar toalhas de uma mala, uma mulher pregunta:
—Não precisará das nossas?
—Sim, sim (o Frade respondeu e pegou) para pisar.

NARRATIVA: Após o Banho e a janta Padre Arkanjo disse a Bobuque para reunir toda a gente na praça. O Padre diante de todos começa a falar:
—Em nome de Deus vos convido para a purgação dos pecados, e vosso arrependimento há de ser muito maior que as negligências: habitais o único castelo sem capela nem altar neste reino cristão e, se quereis o divino perdão, prostrai-vos já para as penitências!
Todos ajoelhados rezam, menos o Poeta. Bobuque o diz:
—Reze, homem, pelo amor de Deus!
—Não creio nesse Deus (respondeu o Poeta)
—Pelo seu próprio bem (Bobuque lhe disse) Imploro, meu amigo.
O Poeta começa a mover os lábios.
O Padre se dirige ao Poeta e diz:
—Reze com o coração, meu filho, reze (e continuou a falar com o Poeta) Sabe por que você não reza com o coração? Sabe por que a fé escapa do seu peito como fumaça, filho?
—Tenho sua idade, padre, não me chame de filho(responde o Poeta)
—Sabe por que se atreve a falar assim até com o enviado de Deus?(lhe disse o Padre) Teu coração, pobre homem, está possuído pelo demônio em forma de mulher!...
O Poeta, num pulo, começa a esganar o Padre. Os soldados tiram o Poeta de cima dele e o Padre diz:
—Amordacem o demônio! Amordacem, amarrem e lancem ao calabouço!
Um soldado perguntou a Bobuque:
—Onde era o calabouço ?
—Não temos calabouço, onde era virou despensa. (respondeu Bobuque)
—Nem capela, nem calabouço (disse o Padre de braços abertos em cruz) Que castelo é este, Senhor? Será verdade o que vejo e ouço? Que faço, meu Pai?!
Fica um tempo de braços abertos e depois da ordens:
—Prendam esse pobre corpo nalgum canto, longe das cocheiras para que o demônio não passe para os cavalos!
O Padre apontou Flor que olhava o tempo todo para o Poeta e disse:
—E em outro canto prendam o corpo desta outra endemoniada!

NARRATIVA: Até a meia-noite os terços continuaram, até o nono, depois o padre anunciou:
—Foi apenas a primeira nona da nossa novena, irmãos. Nove vezes rezaremos nove terços em jejum, e ao fim, tão certo como é certa a morte e a vida é eterna, sentireis a alma leve como nunca e finalmente estará livre do Mal este castelo! Dormi em paz, mas acordai prontos para continuar ao nascer do sol: ainda sinto muitos demônios entre vós! Boa noite, com a graça de Deus e do Espírito Santo!

NARRATIVA: No dia seguinte a sineta da cozinha badalou diferente na mão de um soldado, mas mesmo assim assanhou a fome em todos. No entanto, padre Arcanjo já estava na praça com o Frade e com os braços em cruz:
—Bom dia, irmãos, e glória a Deus nas alturas! Oremos!
—Em jejum, senhor?(Bobuque perguntou )
—Bebei água, irmãos, para que vossas vozes subam ao céu claras e puras...(respondeu o Padre)
NARRATIVA: Começaram a rezar, porém Sábado se recusou. No inicio do segundo terço o Padre fez um sinal para os Soldados e Sábado foi levado para junto ao Poeta. Logo Sexto e Domigo de levantaram e foram levados também para junto ao Poeta. No fim do segundo terço, o Cozinheiro levantou rapidamente e destribuiu pães para as crianças e um Soldado o empurrou, a cozinheira o acudiu e saíram da praça de mãos dadas. Depois o Pedreiro e o Perneta trocaram um olhar e levantaram juntos, e foram até o salão já feito prisão. A Costureira Mestra levantou, era muito velha, e foi atrás deles. Padre Arkanjo diante disso dizia:
—Satanás aqui fez seu reino... Tende piedade dessa gente, Senhor.
Ninguém mais responde as orações, um Soldado se aproxima e pergunta ao Padre:
—Prendo todos, senhor?
O padre cai de joelhos e fala:
—Falhei, Senhor.

NARRATIVA: o Padre se dirigiu até seu quarto, onde ficou até decidir ir embora. Já na saida Bobuque andou ao lado da liteira até o portão e disse ao Padre:
—Desculpe, padre, não sei o que dizer. Sabe o povo como é...
—Aqui o Reino de Satã me derrotou, mas fé e forças maiores Nosso Senhor terá para voltar, e então se arrependerão. Principalmente o senhor. (lhe respondeu o Padre)
—Eu, padre?! (perguntou Bobuque)
—Podia ter usado sua autoridade. Mandasse chicotear alguns, os outros pensariam duas vezes. (lhe respondeu o Padre)
—Mas isso, padre, seria contra meu princípios: sou cristão. ( respondeu Bobuque ao Padre e o silêncio reinou para a saída dele)
Todos foram para o almoço, Bobuque pede silêncio e diz:
—Graças por mais este dia, por este pão, por mais esta provação.
—Amém (uma menina fala)E já podemos comer à vontade?
—Claro (respondeu Bobuque)
—Acha que eles vão desistir? (Sábado perguntou)
—Claro que não (respondeu Bobuque) Mas você não tem fé em Deus? Coma!

6º ATO - NUVENS NEGRAS
NARRATIVA: O assunto que andava por praticamente todo o reino era o mesmo, sobre o novo Rei, aquele que não cuidava do reino e só se importava com a Música agora, assim  esquecendo totalmente da peste... Seu irmão, o Principe, quer o reino para ele, então certamente haverá uma Guerra... Naqueles dias notícias se cruzaram e, de cochicho em cochicho, de riso em riso, correram juntas todo o Castelo Real e chegaram aos ouvidos do Rei. Sobre o Castelo do Canto alguém contava:
—Vossa Majestade lembra? Contava-se que de lá saíam destratados os coletores de impostos e desmoralizados os padres visitadores. Padre Arcanjo, um dos mais fervorosos emissários do Arcebispo. Sabia disso Vossa Majestade? Tinha voltado tão derrotado que por vontade própria se trancava num mosteiro, onde só a pão e água vivia em orações.
—Verdade?(o Rei falava) Teria mesmo tanta ousadia aquele bobo feito duque pela caduquice de meu pai?
—Por via das dúvidas (um conselheiro falava no ouvido direito do Rei) não seria melhor enviar uma patrulha reforçada acompanhando os mesmos coletores destratados? Afinal, quem humilha um enviado do Rei, ao próprio Rei humilha...
—Mais ainda, Majestade (dizia um outro conselheiro em seu ouvido esquerdo) Não seria de bom alvitre enviar alguns pelotões ou mesmo um batalhão? Poderiam recrutar os jovens do tal castelo para nossas tropas, andamos precisados.
—Melhor ainda, Majestade (um outro conselheiro dizia) Esse batalhão poderia escoltar também um mais fervoroso padre visitador, com o que Vossa Majestade conseguiria também as boas graças do Arcebispo, ultimamente tão irritado com a peste que, dizem, é castigo de Deus aos pecados do Reino...
—Mas que pecados? Vivemos na santa paz da música! (disse o Rei)

NARRATIVA: Em uma sala de reunião, no Castelo Real varios Padres conversavam sobre a peste. Em um mapa havia os castelos que pertenciam ao reino, uma cruz preto nos que a peste já estavam e uma cruz vermelha no Castelo do Canto. Apontando a cruz vermelha o Arcebispo disse:
—Aqui Satã fez morada. E se não podemos esconjurar a peste, que o Rei nos ajude a derrotar o Diabo.
Padre Arcanjo se ajoelhou e disse:
—Contai comigo, reverendíssimo, dai-me, suplico, mais uma oportunidade! Apenas iluminai minha fraqueza, dizei-me como enfrentar aquele bando de possessos: até as crianças se recusavam a obedecer as ordens do Senhor!
O Arcebispo então falou:
—Que a ordem seja: o fim daqueles demônios ou a destruição da Fé! Pois não vos esqueçais: a descrença também é uma peste, começa num ponto e se espalha como os ventos...
—Mas como faremos, reverendíssimo? (perguntou Padre Arkanjo) A não ser que acabemos com todos à espada...
—Por que não? (o Arcebispo respondeu) Espadas não têm mesmo forma de cruz?

NARRATIVA: Do outro lado da familia da nobreza, o Principe armava seu exército como podia, pois não tinha dinheiro. Então saia em procura de jovens para participar de seu exercito. Nas reuniões que haviam os veteranos saudavam seu futuro Rei:
—Morra aquele Rei! Viva este Rei! (Os soldados gritavam)
O Principe respondia:
—Até avitória!
Os soldados gritavam:
—Pelo Reino! Pelo Rei!
Agora em um momento serio o Principe falava:
—Aqui há algumas moedas para vocês, mas atenção: o primeiro que gastar uma só dessas moedas por aí, aproveite bem a noite porque antes de acordar já será um homem morto!...
E continuou a dizer:
—Pensam que passo o tempo caçando. Que pensem. Não devem desconfiar de nada, mas terão certeza de que estou armando um exército se vocês começarem a gastar por aí... Que custa esperar mais um pouco? Aliás, depois da vitória, todos receberão de prêmio o soldo de um ano!
Um soldado Veterano disse para o Princepe:
—Desculpe, Majestade, mas sabe como é o vinho... Depois do primeiro copo, a gente tem vontade de tomar o terceiro, e as moedas começam a cocar no bolso...
—Pois é.(respondeu o Principe) E por causa de umas bebedeiras podemos perder a guerra, o Reino, a vida...
O soldado veterano devolve as suas moedas e diz:
—Eu é que não vou confiar em mim. Peço por favor, Majestade, guarde meu soldo até a vitória.
—Você será recompensando, meu bravo (o Príncipe lhe dizia) É essa confiança que ganha as guerras!
Todos os soldados fizeram a mesma coisa e o Principe os prometia emocionado:
—Não vou esquecer tamanha fidelidade. Até a vitória!

NARRATIVA: Mesmo no campo, ninguém estava livre da peste. Por toda parte vagavam bandos de flagelados, gente que tinha tido na família algum empesteado e por isso eram expulsos das aldeias: até os médicos acreditavam que a peste pegava mais entre parentes, e assim queriam cortar o mal pela raiz. E, um dia, um dos maiores bandos de flagelados chegou às plantações do Castelo do Canto. O trigo, o centeio e a aveia estavam ainda muito novos, as plantas ainda nem tinham espiguetas mas, aqueles homens olharam o castelo lá no alto e nem precisaram falar, dava até para ouvir os pensamentos: quem tinha plantações assim, decerto teria também armazéns cheios... Mas teria muitos soldados o castelo? Muralhas muito altas? Muitas armas? O chefe do bando era um cego com três facas no cinto e roupas de couro de vários tamanhos, aqui e ali furadas e manchadas de sangue seco. Tirou as facas, as roupas, vestiu um manto e disse:
—Vou lá sondar. Me esperem.
—Não é melhor ir mais alguém junto? (alguém disse)
—Não. Não vão desconfiar de um pobre cego... (respondeu o Cego)
Quando se afastou, alguém falou:
—O que um cego poderá ver para nos contar?
—Ver, não verei nada(respondeu o Cego) mas vou ouvir tudo...

NARRATIVA: o Principe resolver fazer uma visitinha ao Duque de Santa Graça...
NARRATIVA: Naquela mesma noite, o Rei recebia a visita do Arcebispo. Vestido de roxo e amarelo, vinha com o padre Arcanjo e outros de batinas negras, mais um grupo de meninos e rapazolas, todos de branco e de olhos baixos. O Rei saía de uma aula de solfejo e ainda  cantarolava quando recebeu a comitiva na sala de audiências. No lugar da mesa de despachos, estavam agora instrumentos musicais na parede; onde antes ficava um mapa do Reino, agora se via a partitura de uma cantata que o Rei vinha compondo e recompondo há meses.
—Sol fá ré dó dó mi lá (o Rei cantava)
—Boa noite, Majestade (o Arcebispo estende a mão para ser beijada mas o Rei nem nota)
 —Boa noite, fá sol lá mi ré ré dó, a que devo a honra da visita, reverendíssimo?
NARRATIVA: O Arcebispo contou o caso do Castelo do Canto. Padre Arcanjo mordia os lábios. O Rei ouvia cantarolando baixinho.
—Assim, Majestade (o Arcebispo finalizou) o caso me pareceu de tal gravidade que não me atrevi a sozinho resolver o que fazer, pois afeta não só a Igreja mas todo o Reino. Não vos parece?
—Sol ré dó fá. o quê? Sim, claro. Mas... por que a falta de fé num castelete distante tanto afeta ò Reino, reverendíssimo?
—Ora (o Arcebispo respondia)Ora, Majestade, a falta de fé se espalha como peste. E quem,  sem fé em Deus, continuará fiel ao Rei? Quem?!
—Sol lá ré ré si (o Rei nem prestava atenção) Quem o quê?
—Majestade! (o Arcebispo esmurra um tambor e o som traz o Rei à realidade; piscando e  parando de cantarolar.
—Sim, reverendíssimo?( o Rei pergunta)
—Não me ouvis, Majestade? (pergunta o Arcebispo)
—Com todo o prazer, reverendíssimo, tocai o que quiserdes!   (fala o Rei como se não tivesse prestado atençãoem nada)
O Arcebispo já saindo quando o padre se ajoelha diante dos pés do Rei e fala:
—Majestade, concedei-me a graça de vossa atenção! Vi com estes olhos: naquele castelo  habita Satã e sua corte de demônios! É preciso que sejam vencidos pela fé ou pela força  e é em defesa da Fé, em nome de Deus e pela aventurança do Reino que pedimos vossa permissão.
—Para quê, padre? (o Rei perguntava)
—Para deitar fogo naquele inferno com todos seus demônios! (o Arcebispo respondeu)
—E para isso, Majestade, além de vossa permissão, precisamos de um batalhão para chegar até lá, o Reino anda cheio de bandidos (disse o Padre)
 —Por isso mesmo (um conselheiro real falou) não devemos deixar nossos soldados andando por aí, podem trazer a peste para cá...
Padre Arcanjo ainda de joelhos disse:
—Vossa decisão, Majestade.
—Sollá... o quê? Tenho de decidir agora? (perguntou o Rei)
—Sua Majestade quer tempo para pensar (um conselheiro disse)
—Até quando, pelo amor de Deus?  (padre Arcanjo pergunta)
—Até...  (o Rei não tirava os olhos da partitura) até eu terminar esta cantata.
—Até lá, Majestade, para que penseis com carinho em nosso pedido, deixamos um presente: estes jovens cantores, selecionados entre os melhores de todas as paróquias, para que cantem vossa cantata...(disse o Padre)
—São meus? Todos?! (o Rei perguntou) E sabem mesmo cantar?! Um presente realmente digno de um rei! Jamais esquecerei!
—Basta, Majestade, não vos esqueceis daquele castelo... (disse o Padre)

NARRATIVA: No Castelo do Canto vinha o cego se aproximando, porem estava indo para o beira do precipício, Primavera vendo aquilo foi até seu encontro e disse:
— Por aí não, senhor: é uma viagem sem volta! Venha (Levou o Cego para o Castelo)
— Há bandos por toda parte (contou o Cego) Parece o fim dos tempos. Mas que água!
Primavera deixa nos joelhos dele um pão quente.
— Deus lhe pague, filha, há meses não como um pão assim (disse o Cego)
— Vai para onde? (Sábado perguntou)
— Só Deus sabe, filho. (respondeu o Cego)
— Fique quanto quiser (Sábado disse) Quer dizer, se o pessoal, se o Duque deixar...
— Por que não? (Bobuque disse) Temos um meio cego, mas um cego não temos ainda.
— Não caçoe de mim, senhor (o Cego respondeu) Já enxerguei, já vivi muito. Se pudesse, pagaria com trabalho este pão e...
— Sossegue, não estou caçoando. E, se já viveu muito, ótimo: pode contar histórias às nossas crianças, já enjoaram das nossas. (disse Bobuque)
As crianças se sentam ao lado dele e ele diz:
— Histórias? Sim, tenho muitas histórias, trago muitas novidades....

NARRATIVA? Mais visitas chegam naquele. Quatro homens, disfarçados de caçadores, no grupo um dos presentes era o Príncipe.
— São apenas caçadores (disse Bobuque)
— Não se esqueçam ( na estrada, o Príncipe dizia aos oficiais) ajam e falem como caçadores, para ninguém saber que estivemos aqui.
O Príncipe para diante do Castelo e fala ao oficiais:
— Vejo aqui o que faltava para um bom plano de ataque ... Vejam bem: esta é uma estradinha terrível mas, um atrás do outro, por aqui pode passar uma companhia de cavalaria. Nossa infantaria poderá até marchar em calma, guardando forças para a batalha pois, quando eles vierem para o contra-ataque, receberão nossa cavalaria pelas costas e, quando virem, estarão lutando em duas frentes. Serão esmagados, e depois marcharemos para o Castelo Real. Que acham?
Os oficiais concordam.

NARRATIVA: No Castelo Real, as coisas ficavam sérias. O Rei despreocupado dos assuntos do Reino, nem se deu conta quando a Peste chegou até o Castelo Real.

NARRATIVA: No Castelo do Canto, aqueles quatro bons caçadores não quiseram jantar no refeitório: pediram desculpas, eram gente bruta, preferiam arranchar nalgum canto. Eles iam até o longo do Rio ver os Soldados do Rei, para saber como estavam preparados.
—O que vocês vão fazer ao longo do Rio? (Sexto perguntava)
— Vamos caçar por lá (explica um dos caçadores) e temos medo dos soldados confiscarem as peles.
Sexto pergunta aos caçadores:
— Posso viajar com vocês? Quero conhecer um pouco mais do mundo.
— Gosta de caçar, rapaz?(um dos caçadores diz)
— Já matei gaviões no ar (respondeu Sexto)
— Ótimo. Bons arqueiros sempre são úteis(respondeu o caçador)
Sexto corre até Bobuque para lhe pedir permissão, mas Bobuque já responde antes da pergunta:
— Claro, pode ir. Ninguém segura o vento.
—Aonde você vai? (pergunta Sábado para Sexto)
— Não sei (respondeu Sexto)
— Sempre achei que um dia ele iria mesmo (Bobuque disse)
— A vida é assim (disse Poeta) Há os que viajam para fora e os que viajam para dentro...
— De um jeito ou de outro (Sábado falou) vamos acabar sem braços para o trabalho.
— Não se preocupe (Bobuque respondeu) As crianças continuam crescendo.
NARRATIVA: No dia seguinte bem cedinho os caçadores partiram acompanhados de Sexto. Um pouco depois, Fruta e Dom Carlos Felipe chegaram. No salão, Dom Carlos conta a Bibuque:
— O Reino tem mais bandidos que piolhos. Há um bando acampado ali no vale. Por isso vim,  senhor, para ficar às vossas ordens.
NARRATIVA: O Cego perguntou as crianças quantos Soldados havia no Castelo. E ficou surpreso quando lhe responderam que não havia nenhum.
NARRATIVA: Dom Carlos contava que foi até o Castelo Real e apresentou sua noiva Fruta ao Rei, e pediu para casar. Ele sem dar a menor atenção por causa da música, concordou. Fruta os contava como o Castelo Real estava descuidado, parecia um monte de lixo, não cheirava nada bem. Até que como presente de casamento do Rei, Fruta pediu que o Rei lhe colocasse no comando do Castelo Real por um dia. E assim foi feito. No dia seguinte todo o Castelo Real estava cumprindo as ordens de Fruta, ela fez com que tudo ficasse limpo e em ordem novamente. Ordenou que limpassem todos os quantos, o salão, a cozinha e todos os outros lugares do Castelo, e ordenou que todos tomassem banho. Ensinou os padeiros a fazer pão só com farinha, sal e água. E os cozinheiros que as carnes deviam ser assadas para uma melhor alimentação. Após tudo limpo e bem cuidado, o Rei ficou com tamanha surpresa e agradeceu muito a Fruta. Fruta e Dom Carlos Felipe vendo que já estava tudo em ordem, pediu para viver no Castelo do Canto. O Rei concordou.
Dom Carlos Felipe então fala se referindo a Bobuque:
— Por isso senhor, coloco minha espada a vosso serviço: sois um homem de honra.
— Pois se honra puder ajudar, meu caro cavaleiro (diz Bobuque) desça com a gente ao vale amanhã, estamos pensando em fazer açudes pra criar mais peixes. Quanto à espada, também podemos usar: o mato está avançando nas plantações.
NARRATIVA: O Cego não acreditava que um Castelo como aquele existia. Pensou sobre o que iriam fazer, assaltar. E ficou com remorso. Mas havia crianças famintas no vale.
De noite na janta todos em silêncio até alguém dizer:
— Damos graças por mais este dia, este pão e também por termos um novo companheiro.
— Quem sabe nos ajude a enxergar o que não vemos (alguém disse ao Cego)
— Pode me ajudar nos teares, não é preciso enxergar para tecer. (disse uma mulher ao Cego)
— Não: talvez ele goste mais de trabalhar nos moinhos. (outro dizia)
— Nem uma coisa nem outra. Eu é que preciso de mais alguém para trançar as redes. (dizia o Pescador)
— E o que fazia antes? (perguntou Bobuque ao Cego)
— Era comerciante (o Cego respondeu)
— Ótimo  (disse o Tesoureiro)Pode me ajudar: já temos serviço demais para um tesoureiro só.

NARRATIVA: Após a janta o Cego foi dormir e na cama ficou pensando em o que fazer. Logo dormiu. Amanhecendo, recebeu um cutucão: era o Tesoureiro. Recitou uma relação de todos os estoques do castelo, perguntou como podiam negociar as sobras da melhor forma e depois disse:
— Bobuque anda preocupado, quer achar um jeito de ajudar esse bando acampado lá no vale.
— Ajudar? Por quê? (disse o Cego)
— Por que não? (o Tesoureiro falou) Hem? Se você foi mesmo comerciante, pode nos ajudar nisso. Pense!
E o Cego ficou a pensar.


7º ATO – PESTE, ÓDIO E GUERRA.
NARRATIVA: O Cego se pos a pensar e depois de um tempo parado sentado na sombra duma árvore velha ele sai das sombra, abri os braços e grita:
—Venham!
O bando aparece de todos os lados com cacetes e facas, foices e facões.
—Fiquem de costas um para o outro! (Dom Carlos Felipe diz)
—Parem! (o Cego gritou) Parem e escutem! Não precisamos mais assaltar, descobri o remédio para todos os males.
—E que remédio é esse? (alguém do nando perguntou)
—Trabalhar (o Cego disse) Temos de trabalhar.
Após um silêncio Sábado diz ao Cedo:
—Continue.
—Podemos viver aqui no vale vigiando as plantações  (o Cego continuou) se nos derem alguma comida agora e ajuda para erguer umas cabanas.
—É, uma aldeia realmente iria bem por aqui... (disse Bobuque)
—A terra é ruim mas, bem tratada, dá de tudo (Sábado falou)
—Vocês têm sorte, o inverno ainda está longe e é tempo de colher pra plantar (o Poeta disse)
—Fazendo um açude hoje (Sábado falou) podemos trazer peixes.
Domingo emendou:
—Amanhã podemos fazer um forno, temos bastante farinha.
—Então que estamos esperando?( Bobuque falou)
—Deixe comigo, senhor(alguém disse e pegou a mareta da mão de Bobuque)
—Não quer buscar mais ferramentas, Dom Carlos? (disse Bobuque)
Bobuque agacha ao lado do Cego e diz:
—Obrigado.
—De quê? (o Cego respondeu) Agradeça à sua própria gente.
—E leve a sua para o castelo até terem casas (disse Sábado)
—Foi por pouco (o Cego disse a Bobuque) Senti que tudo ficou por um fio.
—Mas facões conhecem pás, e foices conhecem picaretas (Bobuque respondeu)Não são armas, são ferramentas!
Começa a chover e anoitece.

NARRATIVA: No dia seguinte, as crianças estavam brincando até avistaram alguém vindo e correram de volta dizendo:
—É o padre!
—Podem me prender, podem me bater e me excomungar e até me matar, daqui não saio pra rezar mais nem um minuto. (disse a Cozinheira)
—Nem eu (o Cozinheiro disse) Minhas orações são aqui mesmo, o pão nosso de cada dia é este aqui.
—Acudam, pelo amor de Deus (suplicava o Padre) Pelo amor de Deus
o padre desmaiou, quando acorda Domingo esta ali com água e diz:
—Beba.
—Fuja: é a peste(disse o Padre)
—Decida-se, padre: quer ajuda ou não? ( disse Domingo) Vê aquela gruta? Vamos lá, o senhor ainda pode andar.
—Quem é você? (o Arcebispo perguntava) Vem em nome de Deus ou...
—Que diferença faz agora? Vamos. (disse Domingo)
Eles de dirigem até a gruta, após isso Domingo diz a todos:
—Fiquem longe de mim e daquela gruta. Vou ficar com eles, e que deixem comida e água na boca da gruta todo dia. No dia em que eu não sair pra pegar, que ninguém entre lá: joguem lenha e botem fogo. Entenderam?
Saiu dali e foi para a gruta. Bobuque vendo aquele tumulto que estava formando disse:
—Que é que vocês estão discutindo? Não há o que fazer nem devemos fazer coisa alguma, só levar água e comida todo dia, não ouviram o que ele disse? É assim que ele quer.
—Mas, pelo amor de Deus (Sábado dizia) ele também pode pegar a peste!
—E você pensa que ele não sabe? Não é mais um menino. (respondeu Bobuque)
A tardezinha, quando saiu para pegar a comida, Domingo acenou.
—Quer que eu fique com você? (Bobuque perguntou)
—Não (Domingo respondeu) Não estou sozinho.

NARRATIVA: Anoiteceu, ventava e, na muralha, Sábado e Primavera viam as primeiras lamparinas da aldeia piscando lá no vale. Ouviram pancadas no portão. Abriram, Sexto vem correndo para falar:
—Vim correndo. Vim avisar: o Príncipe vai atacar o Reino por aqui.
NARRATIVA: quando amanhece, Sexto se dirige até onde todos estão reunidos e pergunta a Bobuque:
—Que vão fazer?
—É o que eu ia perguntar: o que você faria?(disse Bobuque)
—Lutar (Sexto falou)
—É o que eu ia dizer, senhor (Dom Carlos Felipe falou)
—Lutar? Com quê? Com que soldados? (perguntou Bobuque)
—Ainda não morri, Duque.(respondeu Dom Carlos)
O Perneta pegou a besta de Sexto e fala:
—Vocês não têm outra desta?
—Temos muito azeite pra ferver (o Cozinheiro disse) E as muralhas são altas...
—Ora (Bobuque falou) De que adianta lutar se não vamos vencer? Aí não terão mesmo piedade.
—Quem não luta perde sempre, senhor (Dom Carlos respondeu)
—Muito bem, e se vencermos? (Bobuque perguntou) Que fazemos depois? Vamos vencer também o batalhão seguinte? E o seguinte? Não foi pra viver em guerra que trabalhei tanto.
—Sinto que devo lutar, senhor (Dom Carlos falava) Não serão prejudicados, dou minha palavra de honra: lutarei sozinho fora do castelo.
—Sozinho não (Sexto falou) Aquela estrada é tão estreita que eles vão ter de passar um por um ou dois a dois. Com sorte, um arqueiro pode parar um batalhão ali por muito tempo.
—Se me levarem até em cima da montanha (o Perneta disse) posso rolar muita pedra neles.
Bobuque ficou nervosa e disse:
—De repente viraramtodos cavaleiros?!...
—Quando resolvemos viver em paz (o Cego falou) a guerra procura a gente. Era um belo castelo...
—Por que você não busca mais gente pra lutar em vez de ficar resmungando? (Sexto falou) Desculpe, mas é o que sinto.
O Cego então fala:
—Chamem lá os que quiserem lutar.
Dom Carlos Felipe disse:
—É mesmo,emboscando em vários pontos podemos atrasar o avanço deles um dia ou até dois. Dava tempo de alguém galopar até uma guarnição do Rei e pedir ajuda.
—Maravilha! (Bobuque disse) Em vez de deixar a guerra passar por nós, vamos ficar bem no meio da guerra!
—Entendo que não queira lutar, mas não podemos ficar de braços cruzados(disse Fruta a Bobuque) Existe muito jeito de lutar, a  gente pode se escondernas grutas levando tudo que puder.
A Cozinheira bateu palmas para os velhose disse:
—Vamos! Não ouviram? Eles vão conquistar um castelo vazio...
Começam a carregar mantimentos e colchões, roupas e panelas...
—Isso pode ficar (o Poeta disse) Não tem valor para eles...
Bobuque perguntou ao Poeta:
 —Você acha tudo isso ilusão e loucura ?
—Acho que não é hora de palavras (o Poeta respondeu)
—Seja o que Deus quiser. (diz Bobuque, olhando o céu)
—Pois acho que agora Deus quer que a gente lute (Primavera passou dizendo)

NARRATIVA: Na gruta, às vezes o padre acordava
—Onde estou, Senhor meu Deus? (perguntava o Padre)
—Na terra ainda, padre. (respondia Domingo)
—Quem é você? (perguntava o Padre)
—Que importa? Importante agora é descansar. (respondia Domingo)
—Descansarei nos braços do Senhor.(dizia o Padre)
—Antes, beba mais um pouco. (falava Domingo)
—Não será um anjo, Senhor? (perguntava o Padre)
—Anjos têm asas, padre, e eu tenho as costas doídas. Mas durma: quando acordar, estarei aqui. (respondia Domingo)
—Se acordar neste mundo...(falou e dormiu o Padre)
O padre acorda novamente diz:
—Deve ser o purgatório... Perdoai-me, Senhor.
—Estou aqui, padre. (respondeu Domingo)
—Piedade, Senhor, ele também pegou a peste... (diz o Padre)
—Ainda não, é só cansaço. As suas chances é que aumentaram, padre; não dizem que de cada três empesteados um se salva? Então: um já foi. O soldado.
—Pobre homem. (disse o Padre)
—Realmente: tinha as ceroulas em trapos. (disse Domingo)
—Deus tenha piedade de sua alma. E da sua família. (disse o Padre)
—Quem é você, quem? (perguntou o Padre a Domingo)
—Pode me chamar de Ninguém, padre.(respondeu-lhe Domingo )
—Mas se o Arcebispo se salvar, fará de você alguém muito importante.(disse o Padre)
—Já sou muito importante, padre. (respondeu Domingo)
—No entanto tão moço... Então é filho de quem? De algum conde? Então será filho de algum duque? Ou de um barão?! (perguntava o Padre)
—Padre, alguém já não disse que somos todos filhos de Deus? ( disse Domingo)
NARRATIVA: e o Padre Dormiu ...

NARRATIVA: o Castelo Real foi tomado completamente pela peste, no desespero de todos do Castelo, acabou que houve um incêncio que destruiu o Castelo inteiro, então  o Rei fugiu do Castelo Real junto com a Rainha e mais ninguém. O reino estva sem dono...

No Castelo do Canto, Dom Carlos Felipe falava com todos os combatentes:
—Senhores, é a primeira vez que comando uma tropa sem treino e com tais armas. Mas todo inimigo é, no fundo, um animal: avança se não encontra resistência, recua se tem de pagar caro pra avançar.
—Pagarão caro (Sexto falava)
—Soldados vivem pra lutar (Sábado falou) Nós só sabemos trabalhar, e eles sabem disso.
—Já viram uma cadela defendendo a ninhada? (Dom Carlos perguntava) Terão de lutar assim: com raiva, unhas e dentes!
—Maior será a vingança deles (Sábado resmungava)
Dom Carlos Felipe então repassa o plano para todos e depois fala:
—Procurem mais ferir que matar. Um soldado ferido dá trabalho e atrapalha os outros.
—Por que também não vamos para as grutas? Se acharem o castelo deserto, passarão e irão em frente (Sábado dizia)
Dom Carlos Felipe respondeu:
—Depois da cavalaria decerto virá um batalhão de infantaria, e deixarão pelo menos um pelotão no castelo.
—Meu filho (o Cego disse) até eu vejo que o remédio é lutar.
Os primeiros soldados do Principe começam a serem vistos...

—Muito bem, senhores, chegou a hora
Todos correram para seus postos, alguns rastejando para não ser vistos. Dom Carlos avança em direção aos soldados, mas Sexto o puxa e pergunta:
—Onde vai? Ficou louco?!
—Sou cavaleiro...(responde Dom Carlos)
Logo que chega até eles, penguntam:
—Quem é você?
—Dom Carlos Felipe de Castela y Bourbon Aguillar dos Santos Silva, a serviço do Rei e na defesa do Reino. (responde Dom Carlos)
—Seu Rei tem os dias contados (um dos cavalarianos disse) Por que não se junta a nós?
—Tenho honra (Dom Carlos Felipe respondeu) e tenho também o dever de prevenir que por aqui não passarão. Bom dia, senhores.
Da as costas ao pelotão. Um dos cavalarianos ergue a lança. Sexto atira uma fleza no cavalariano. Dom Carlos Felipe se volta tirando a espada e o pelotão avança galopando.
—Meu Deus (Sábado disse)
—Deus está sempre ocupado nessas horas (Dom Carlos Felipe falou) Agora, lute!
Acontece uma luta, até que Dom Carlos fica com o pé no peito e a espada no pescoço do cavaleiro e fala para ele:
—Muito bem. Diga ao Príncipe que, antes de chegar ao portão daquele castelo, perderá pelo menos metade da tropa. Entendeu?
—Você está louco(o cavaleiro disse)
—Apenas dê o recado—(Dom Carlos Felipe disse e o chutou)

Após o recado o Principe diz:
—Vão defender essa passagem enquanto alguém foi buscar reforço. Vamos atacar já!
NARRATIVA: Quando chegaram ao começo da estradinha e, quando tiveram de ir a passo, caíram na primeira armadilha. Setas, lanças, pedras. E voltaram carregando feridos.
—Covardes! (o Príncipe falava) Temos de estar naquele castelo antes de anoitecer!
NARRATIVA: Mas, quando a noite caiu, ainda não conseguiam avançar pela estradinha e aumentavam os gemidos dos feridos. Então armaram barracas e fizeram fogueiras. Nesse dia o Pedreiro morreu.
—Amanhã (o Príncipe disse para deus soldados) logo que amanhecer atacamos duma vez por todas. E parem de gemer!

NARRATIVA: a morte do Pedreiro foi o motivo pelo qual se colocou em dúvida, entre continuar lutando ou não. Mas decidiram que como que já tinham começado, agora iriam até o fim.

NARRATIVA: No dia seguinte...
Na gruta, Domingo e Padre Arcanjo acordam. o Padre fala:
—Sonhei que o Arcebispo morria. (Domingo pegou o pulso do Arcebispo)
—Sonhou certo, padre. (respondeu Domingo)
—Por que cuida de mim? Piedade? (perguntou o Padre)
—Não sei, padre, sinto que devo. (respondeu Domingo)
—A piedade pode ferir mais que o ódio(disse o Padre)
—Ora, padre, coma alguma coisa e descanse(disse Domingo)

NARRATIVA: Lá fora, a luta recomeçou e, agora, os cavalarianos lutavam com medo, e os do castelo, com ódio. Naquele dia, de emboscada em emboscada, entre pedras e fogo, os cavalarianos avançaram até metade da estradinha, que já  parecia a mais longa das estradas: a cada metro, deixavam um ferido; e já  brigavam entre os próprios pelotões para decidir quem iria à frente. Dom Carlos Felipe sempre comandava mandando acertar os dá frente primeiro, pois assim chegaria uma hora que o Principe teria que mandar alguém ir por causa do medo causado. Mas mais um cairia naquele segundo dia: o Carpinteiro, com  uma lança nas costas, rolou pela ribanceira abraçado com dois soldados. No terceiro dia foi a vez do Ferreiro, pateado por um cavalo, pisado e queimado no próprio fogo, mas os soldados não avançaram mais naquele dia.
—Lutam como demônios (disse um soldado)
E alguém disse ao Principe:
—Talvez, Majestade, seja melhor mudar de tática... Eles lutam como demônios!
—São só velhos e aleijados! (o Príncipe repondia bravo)Digam à tropa que terão de prêmio o soldo de dois anos!
NARRATIVA: Mas no quarto dia ainda não conseguiram chegar ao portão do castelo. No entanto, foi a vez do Perneta e dos manetas: na última emboscada, rolaram pedras e mais pedras até não poderem mais recuar, os soldados já estavam entre eles e o portão. O Perneta estava ferido na única perna e os manetas nos únicos braços. Morreram lutando os três juntos, de costas coladas, emboladas em sangue e azeite. Nesse dia também morreu lutando Nominado, o cachorro de Bobuque. Desde o começo andava dividido: não sabia se seguia Bobuque, se ia lutar também. Quando decidiu, lutou ao lado de Sábado, morreu trespassado por lança e pisoteado por cavalos, e os atacantes de novo recuaram. Bobuque foi até lá, tirou a lança do cachorro eficou com ela. A notícia correu entre os homens da aldeia ''O Duque vai lutar!'' e cada um se firmou mais nas pernas e nas armas. Os novos ataques foram repelidos com fúria, e mais nenhum atacante passou além do corpo de Nominado: ele ficou onde tinha caído, com um sorriso que nem parecia morto. Vários homens da aldeia também estavam mortos ou feridos. Os velhos músicos passavam os dias juntando pedras para as sepulturas. O Cego continuava sentado num canto afiando as facas. O Cozinheiro pediu alguma pedras para fazer um fogão no alto da muralha, bem em cima do portão: os primeiros soldados a entrar no castelo passariam por um banho de azeite quente, e depois ainda teriam pela frente barricadas que Sábado inventou de erguer na praça. Dia a dia, Sábado ia virando o comandante, e agora até Dom Carlos Felipe obedecia a suas ordens, mesmo porque não ordenava, perguntava o que achavam disto ou daquilo e, quando viam, estavam fazendo o que ele tinha perguntado.
—Mas amanhã (o Poeta falou para si mesmo) vai ser o último dia.
NARRATIVA: de noite um homem e uma mulher, bateram no portão da frente.
 Sábado perguntou:
—Quem está ai ?
—É o Rei. (a voz velha e cansada respondeu)
Quando entrou o Rei contava a todos:
—O Reino não existe mais, estão lutando por nada. ( falou o Rei) A peste tomou conta do Castelo, houve um incêndio, as aldeias estão arrasadas, o caos total. Se ele quiser, que me mate e fique com o que restou... Que ninguém mais morra pelo Rei ou contra o Rei.
—Digam que ele está errado (a Rainha disse) Que viva o Rei!
—Ele está certo (Bobuque disse)
Mas Sexto falou:
—Não lutamos pelo Reino mas pelo castelo, senão nos destruirão.
A Rainha se lembra de uma coisa que ouviu e fala:
—Então esse era o plano do Príncipe: atacar em duas frentes pra nos pegar pelas costas... Será que ainda não sabe dessas notícias?

NARRATIVA: Naquele mesmo momento, o Príncipe recebia as notícias. Planejava o ataque da manhã seguinte quando um mensageiro chegou. Ele leu a mensagem e, sem dizer nada, passou o papel aos oficiais. Todos leram e ficaram esperando, até que um tomou coragem:
—Então recuamos, Alteza? (alguém pergunta ao Príncipe)
—Até agora me chamava de Majestade, não?  (fala o Príncipe)
—Desculpe, Majestade, mas recuamos? ( pergunta novamente)
—Recuar?! Agora que temos pela frente só esse castelo de coitados? Não leram a mensagem? Não tem mais defesas o Reino!... (disse o Principe)
—Mas tem a peste, Majestade... (um soldado fala)
—Pestes passam, os fortes ficam. Estão com medo? (perguntou o Príncipe)
Todos se calam até um falar:
—A tropa tem medo, Majestade. Dizem que, se apenas pra chegar à muralha sofremos tanto, quanto mais pra entrar no castelo...
—Muitos já teriam desertado (falou o Soldado) se não fossem tão leais ao Príncipe, e decerto só atacariam comandados pelo Príncipe em pessoa.
—Eu na frente do ataque? Estão loucos?! Não sabem que num ataque assim os da frente quase sempre morrem? ( disse o Príncipe)
—Mas era uma promessa, Majestade, não? Sempre disse que comandaria o ataque ao  Castelo Real! (falou o Soldado)
—Não a um castelinho à toa no meio do caminho... (disse o Príncipe)
—Mas, Majestade, as notícias não dizem que esse castelo é agora a única defesa do Reino? É como atacar o Castelo Real... (falou o Soldado)
O Príncipe acabou com a reunião, e foi descansar...

NARRATIVA: Antes do amanhecer, o Rei tomou banho e vestiu roupas de Dom Carlos Felipe. Magro e mais forte, sofrido e decidido até nos mínimos gestos, agora parecia mesmo um rei e saiu pelo portão com o cavaleiro de um lado e, do outro, o Poeta com um pano branco amarrado numa vassoura.
—Você? Mas você... ( disse o Principe assim que viu o Rei)
—Eu mesmo, no comando do Exército Real (dizia o Rei). Tuas tropas já fugiram na fronteira do rio, sabe?
—O que faz o Rei aqui?(falou assustado)
—Então me reconhece Rei. Melhor. Mas vamos ao que interessa. O que meu irmão prefere: rendição e meu perdão ou continuar essa guerra? Vejo que contra velhos e aleijados não levou muita sorte...
O Príncipe mordia os lábios, pensando, o Rei então disse:
—Hem? Decida-se, homem: se quer ser Rei, aprenda a decidir!
O Príncipe olhou seus oficiais, todos baixaram os olhos e o Rei novamente fala:
—Pela última vez: decida-se, homem! Ou pegue a espada ou se ajoelhe!
—Viva o Rei! (o Poeta gritou)
—Viva o Rei! (todos gritavam)
O Príncipe ajoelhou, o Rei estendeu a mão e disse:
—Meu perdão, meu irmão. Vamos viver em paz.
 O Poeta olha os cadáveres em volta e fala:
—E eles?


8º ATO - O SOL

NARRATIVA: Os mortos foram levados nas carroças e enterrados no vale. Quando saíram da gruta, padre Arcanjo e Domingo viram as carroças na estrada e o padre foi atrás. Andava como outro homem e sorria com novo olhar. No vale já tinham aberto uma vala e, quando os corpos foram enfileirados no fundo, o padre pegou uma pá e começou a jogar terra. Bobuque ofereceu outra pá ao Príncipe.
—Padre, você não vai fazer um sermão?(alguém perguntou)
—Já fiz, com a pá.
Bobuque vagava o olhar pelas coisas como se nada visse. Sábado chega até ele.
—Vamos? (Sábado disse)
—Hã? Onde? ( perguntou Bobuque)
—Vamos! (Sábado disse)
—Fazer o quê? ( perguntou Bobuque)
—Viver! (Sábado disse)

NARRATIVA: E a vida continuou no Reino. O padre Arkanjo virou o Bisbo Arkanjo, A peste acabou, o Rei voltou e o Reino se organizou...

7 comentários:

Pedro Manuel disse...

Eu gostei do livro, legal e facilmente compreensivel...
Mesmo sendo baseado na idade media, mantem uma linguagem moderna.
Pedro Manuel

Unknown disse...

achei o livro bem interessante

Suellen Ota disse...

E a primeira vez que eu leio em turma,achei o livro bem interesante.
Suellen Ota

Paula Taynna disse...

Eu achei a história das batalhas do castelo bem legal.
Paula Taynna

Anônimo disse...

Eu achei a história muito legal, tirando alguns erros de digitação e de português de quem digitou o livro...

Unknown disse...

Eu achei um livro super leve e de fácil entendimento.
Ele nos passa a idéia de que mesmo com quase nada, podemos fazer mais do que imaginamos.
O que eu mais gostei no livro foi que cada personagem tem um pouco de si representados, seus medos, sentimentos, crenças e etc.
E a maior batalha que Bobuque e seu povo tem que enfrentar, é pela vida e para conquistarem o seu próprio lar.
Muito obrigada Laura pela minha primeira leitura em classe ter sido iniciada por As Batalhas do Castelo.

Unknown disse...

Eu achei um livro super leve e de fácil entendimento.
Ele nos passa a idéia de que mesmo com quase nada, podemos fazer mais do que imaginamos.
O que eu mais gostei no livro foi que cada personagem tem um pouco de si representados, seus medos, sentimentos, crenças e etc.
E a maior batalha que Bobuque e seu povo tem que enfrentar, é pela vida e para conquistarem o seu próprio lar.
Muito obrigada Laura pela minha primeira leitura em classe ter sido iniciada por As Batalhas do Castelo.